MARTE : O FASCÍNIO VERMELHO

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Marte: O fascínio vermelho

 
Século XXI. Depois de atingir o espaço durante a Guerra Fria, a fronteira final torna-se a busca pela vida. Construímos naves, contamos histórias, mitos e lendas sobre ele. A odisseia planetária desvenda tudo, pouco a pouco - somos bebês, engatinhando na era espacial. Marte é um mundo de maravilhas. Ele guarda seus segredos sobre um mar de enigmas, sigilos, mistérios, profundos questionamentos que afogam o ceticismo e nos faz mergulhar na esperança da busca pela vida. Aquele mundo, em um lugar não tão distante, desafia o limite da Ciência. Até onde somos capazes de chegar?
 


Quando os antigos o observavam através da abóboda celeste, o sangrento andarilho das estrelas parecia ser um deus: Marte, o ídolo olímpico da guerra. Sua ira era temida por alguns, e por outros invocada. A profunda fé no panteão dos velhos gregos os acometia a depositar clamor no deus vermelho das estrelas: Contra ele, o inimigo não podia.
A lança era o seu símbolo: Destemor, virilidade. Através de orações, guerreiros invocavam a agressividade, o lado homem – bravo e bruto de suas mentes. Elas emanavam e percorriam, como o sangue de suas veias através de rituais. Soldados e artilheiros, comandantes, adornados através de alegorias, adoravam ao deus da guerra em meio a libações. Os espartanos mantinham uma estátua do deus “Ares” (Marte) acorrentado em suas colônias e cidades – dali, a bravura militar jamais partia. Nasciam bravos e morriam honrados – guerreiros, de verdade. Seus cantos perfaziam os sacrifícios; mantinham o cargo consanguíneo olimpiano nesta terra, e enquanto a estrela sanguinária, rubro negro em meio ao céu, recobria os alabastros estelares, homens iam para guerra lutar em nome de seus deuses. O costume, tão vivaz quanto outros mais, marcou a espécie humana: Hoje alguns pregam que a luta, também é parte de nossa natureza.
Seja lá como tenha sido no passado, Marte, o planeta vermelho, tem-nos fascinado desde os primórdios da civilização. Sua matiz tão chamativa em meio ao céu tornou-o um mundo de belezas extraordinárias quando observado daqui da Terra. Mil maravilhas se escondem em suas dunas. Nossas mentes não se cansam em criar estas histórias – seres verdes, pequeninos; naves circulares e pirâmides antigas. A face em Marte e a foto tirada pela Spirit no começo deste século são dois exemplos de histórias que em alguns minutos, viralizam, e nos enchem de esperanças – nada mais além de meras ilusões. O fato é que nem mesmo alguns minutos, na velocidade de uma onda eletromagnética separam suas terras cor de sangue da nossa curiosidade. Nós fomos lá, realizamos mil prodígios – mas ainda é pouco comparado ao que sonhamos. Hoje, sabemos que o cenário marciano é bem desolador.

Valles Marineris marineris27.jpg Argyre Planitia - Bacias de impacto Argyreargyre16.jpg Noctis Labyrinthusnoctislabyrinthus4.jpg Cratera Schiaparellischiaparelli1.jpg
Com aparência de um deserto apocalíptico, o ponto vermelho do sistema solar é apenas só mais uma daquelas rochas inabitadas que nos cercam – alguns dizem por aí. Mas o Planeta é sempre bem mais do que isso. Conhecemos as nossas limitações – precisamos chegar lá, pisar, caminhar em suas terras. Marte, ainda é foco, o objetivo espacial. Depois de Vênus ter perdido o cargo de planeta irmão da Terra, o antigo deus da guerra ganhou mais brilhantismo – seu vermelho tornou-se mais revigorante. Hoje ele fascina cientistas e astrofísico, é até onde sabemos o mais propício à vida em algum momento de sua história, e isto tudo, também não é para menos. Depois da chegada da Sonda Phoenix, que deixou a terra em agosto de 2007, as expectativas de que seres microbianos fossem nossos parentes interplanetários mais próximos ressurgiram como a ave mitológica: A descoberta de que em solo marciano havia algo como gelo, deu princípio ao gênese da vida: Seus polos traziam água em estado sólido, e assim como na Terra, há muito tempo atrás, nevava em Marte.
Quando a sonda Viking-2 pousou em Marte em 1976, detectou algo que até então era inimaginável: a emissão de gás metano na região de Nili Fossae [22ºN e 75º] corroborava aos indícios de que uma forma de vida microscópica poderia estar em atividade em algum lugar das redondezas. Atualmente, sabe-se que a Viking não tinha os recursos necessários para explorar a área. Como era apenas uma sonda, desprovida dos utensílios de um jipe espacial, a emissão do gás metano permaneceu como um mistério até os dias de hoje; a discussão que diz respeito às origens desses gases, estende-se através de duas vertentes: a possibilidade de que sejam emissões biológicas, neste caso, encaixa-se melhor em toda história do que os vestígios que atualmente indicariam a atividade geológica do planeta - sabe-se que Marte é um planeta morto. Sua paisagem é inalterada há milênios. Suas placas tectônicas, inativas, dão lugar a alteração do espaço geográfico através das tempestades de areias e vendavais – o planeta, praticamente não se move. E então, o que explica a isto tudo?

Região de Nili Fossae - Fotos retiradas pela Sonda Orbital HiRise. As partes em azul foram retocadas em computador, e de fato, são acinzentadas.PSP_009138_2025.jpgnili-fossae-hirise-Marte.jpgPSP_006989_2025.jpg
Recentemente, após a chegada do Mars Science Laboratory (MSL,“Curiosity”) em Marte, o êxtase em prol da vida extraterrestre no meio científico e midiático atingiu níveis comparáveis ao boom de Star Wars da década de 70. Um dos objetivos da missão é analisar o solo da região de Nili Fossae em busca de evidências que comprovem a atividade biológica, e além de todo o mais, a sonda estacionária orbital HiRise, retira fotos do local de tempo em tempo, atualizando as informações que recebemos. Tudo o que sabemos é que a colina é rica em olivina e outros minerais, assim como a Cratera Gale, local onde a Curiosity pousou. Ela mantém em seu registro geológico um sigilo histórico da história do planeta - sua inspeção, revelaria por exemplo, se a atividade de água em estado líquido já foi realidade no planeta.
Além da descoberta dos gases em Nili Fossae, algo que tem gerado uma dicotomia de opiniões é o fato de que as mesmas sondas que os detectaram na década de 70, indicaram que o solo de Marte é hostil a qualquer organismo vivo conhecido. Altamente venenoso ao metabolismo, a ausência de moléculas orgânicas e a esterilidade de suas terras são decreto de morte reservado para qualquer forma de vida como a conhecemos. A atmosfera do planeta é rala e pouco densa, não impedindo desta forma que raios ultravioletas elevem a um alto nível a radiação nos locais onde as sondas pousaram. Além disso, oxidantes poderosos como o peróxido de hidrogênio também são fonte de desânimo para as questões que envolvam uma possível missão tripulada para o planeta; as roupas dos astronautas seriam corroídas pelas reações.
Mas o que é veneno para nós, é um prato cheio para microorganismos. A vida pode apresentar-se de muitas formas – quem a conhece por completo?

Um dos detritos de asteroides marcianos que caíram na Terra há algum tempo trouxeram indícios de material orgânico fossilizado contido em sua composição. A especulação em cima disto, ainda hoje é crescente. Mars Meteorite LA001.jpg
Um filósofo certa vez se perguntou: Somos humanos porque observamos as estrelas, ou observamos as estrelas porque somos humanos?” Nomes como Spirit, Phoenix, Viking e outros mais, são os que marcam a história deste mundo e fazem jus, aos mitos de toda a antiguidade. Se nossos ancestrais tivessem a mínima possibilidade de espiar o seu futuro, ficariam deslumbrados com a magia que percorre este planeta: Máquinas, criadas por humanos, passam toda a eternidade em outro mundo. Peças que um dia moldadas pela mão de algum irmão deste planeta, contarão a nossa história para o futuro, seja lá ele qual for.
Peter H. Smith, professor de ciência planetária da Universidade do Arizona nos EUA, trabalhou em algumas das missões interplanetárias mais reconhecidas da história; dentre tantas outras mais famosas, a sonda Phoenix caminha lado a lado ao colaborador das missões Apollo. Colocar o homem na lua foi apenas o começo. Segundo ele, o jipe espacial foi apelidado desta maneira pelo fato de que em uma época onde os sonhos de exploração do planeta vermelho estavam quase se extinguindo, a falha técnica de máquinas durante o pouso da Mars Polar Lander em 1999 provocou o cancelamento de outros projetos – a sonda explodiu em plena atmosfera. Dentre os cancelados, estava o jipe espacial Surveyor, que há muito tempo antes teria explorado os polos do planeta vizinho. A Nasa, a mando do governo, ordenou que alguns dos gastos deveriam ser cortados. As sondas foram guardadas e mantidas em bases, arquivadas, para algum futuro próximo ou distante. No ano de 2003, a agência propôs que o projeto voltasse à ativa; Peter e seus colegas desempacotaram o que havia sido posto em uma pausa prolongada e, em poucos dias, já estavam testando a nova máquina, repleta de defeitos que agora, já eram corrigidos. No dia 4 de agosto de 2007, havia chegado a grande hora.
Thumbnail image for phoenix_launch03.jpgA sonda Phoenix, deveria deixar o mundo em que vivemos para sua longa e tão sonhada missão espacial. O burburinho da mídia anunciava os preparativos há alguns dias, e então “logo pela manhã de 4 agosto, a contagem regressiva já havia começado. Smith havia saído rapidamente da sala de controle para observar o lançamento. Eram 5h15m, e as estrelas estavam visíveis. Marte chamava a atenção brilhando no leste. Então, os edifícios se iluminaram conforme o Sol nascia e, em silêncio, o foguete alçava voo; por alguns segundos, a área havia ficado clara o suficiente para a leitura de um livro. Trinta segundos depois, o som do lançamento reverberava, triunfante. Smith havia contraído seu peito contra as ondas de pressão da decolagem e dentro de alguns minutos, estava feito. O lançamento havia durado pouco menos do que o esperado; no céu, apenas a trilha havia ficado escura. Smith e sua equipe haviam voltado para a sala de controle para um lanche e uma xícara de café, quando ele saiu mais uma vez, desta vez para observar o nascer do sol – tão belo, lá no leste. Algo incomum estava acontecendo no céu. Ele levou cerca de alguns minutos para perceber. A trilha de vapor deixada pelos foguetes sólidos estava girando nos ventos estratosféricos, iluminada pelo sol nascente. Aquilo havia o surpreendido: o resultado tinha a forma exata de uma ave, a fênix
Os sumérios, que habitaram a região da mesopotâmia há cerca de 5000 a.C, o apelidavam de Nergal, e assim como os gregos, o adoravam pela tenaz virilidade. Talvez não se tenha a exata razão para que se afirme o porquê do símbolo universal deste planeta seja algo relacionado a um deus da guerra: A cor vermelha? Ela atrai a muitos, e tem muitos significados. ancient Sumerians.jpg
Após uma incessante batalha contra Ereshkigal, a deusa referente à Vênus, na Caldéia, e a Lilith, na mitologia dos antigos habitantes de Canaã, Nergal, o planeta vermelho tornou-se infértil. Um dos Apkallu (também conhecidos como Anunnakis), deuses antigos e primeiros habitantes desta terra, havia desejado o trono dos infernos para governar como o seu pai – teimoso e agressivo, como o filho que se rebela. Ele usou-se da mentira e humilhou Namtar, o fiel servo de Ereshkigal. Conta a lenda que desde então foi-lhe jogada a maldição. Infértil? Marte? O mito nos faz refletir. Soa realista, e bate de frente ao cenário com o qual nos deparamos nos dias de hoje.
Além de toda a mitologia por trás do grande planeta que nos persegue em sonhos desde a antiguidade, discute-se também a existência de seus habitantes – deuses ou ET’s - , eles são algo que acabou por se tornar uma alusão aos nossos medos, esperanças – o que há além do espaço conhecido? Sem dúvida, a Ciência nos possibilita cogitar assim como os nossos antepassados, porém, tudo o que eles tinham era um livro de previsões de astrologia – o primeiro da história. O Enuma Anu Enlil foi o primeiro códice de leis do cosmo.
Ainda hoje ouve-se dizer que OVNIs têm visitado a Terra, e isto além de mito, é referência em Hollywood. Dezenas de filmes nos inspiram e tornam lúdicas as esperanças com a probabilidade que Carl Sagan, fez tão bem em mencionar enquanto em vida. Há possibilidade de vida lá fora é maior do que se pode imaginar.

Os ideais são como as estrelas: você não conseguirá tocá-las com suas mãos. Mas como os marinheiros nas águas desertas, elas podem guiá-lo, e seguindo as estrelas, você chegará ao seu destino.” O que há além do Cosmo? Além do limiar da existência? O que é que haverá em outro mundo? No Olimpo? O maior vulcão adormecido conhecido do sistema solar é também um símbolo que faz menção a nossa espécie: A grande revolução que ainda está para acontecer. Quando ela explodir, como um vulcão que manda lava para os céus, seremos como os deuses das histórias – chegaremos das estrelas e para elas voltaremos. Stephen Hawking disse certa vez que a única maneira de nossa espécie persistir evoluindo, será colonizando a outros mundos: Marte, é o mais próximo dos sonhos.

Monte Olimpo - O maior vulcão do Sistema Solarmons17.jpg Amazonis Planitia - Cratera Nicholsonnicholson2a.jpg Cratera Gusevgusevcrater_globe50_red9.jpg Cratera de Aram Chaosaramchaos811spl_cold4.jpg O mundo vermelho carrega em suas terras o sangue da vitória: O sacrifício necessário. Milhares de nossa espécie deram suas vidas por um sonho. As guerras são marcadas na história sobre o símbolo do patrono universal que brilha forte, acima das estrelas. Qual será a próxima a ser vencida? Precisamos nos unir. Atingir o limite do universo, desbravar os mundos e chegar onde nenhum já chegou.
Grandes homens deram suas vidas pela Ciência, e outros ainda darão as suas – quem será o primeiro a lá chegar?
Aquele vermelho, com um tom desértico de sonho e pesadelo misturados, pode ser apenas ilusão. Mas quem dera um dia, ele brilhe com mais vida. Seu vermelho é por paixão – a paixão da exploração – desbravadores – Marte é a nova América, e desta vez, nós seremos os selvagens.
Na aridez de nossas mentes, aqui vazias como as pedras do Atacama, Marte ganha vida, cor, luz: um significado. Vida lá é só questão de tempo.



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Fonte:http://lounge.obviousmag.org/matchbox/2012/08/marte-o-fascinio-vermelho.html

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