COMO CHICO XAVIER FEZ DO BRASIL O MAIOR PAÍS ESPÍRITA DO MUNDO - INTELIGÊNCIA ARTIFICIAL PÔS A PROVA PSICOGRAFIA DE CHICO CHAVIER

Como Chico Xavier fez do Brasil o maior país espírita do mundo

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O médium conquistou 3,8 milhões de fiéis – e 30 milhões de simpatizantes – em 75 anos de trabalho

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Em 75 anos de trabalho, Chico Xavier conseguiu fazer do Brasil a maior nação espírita do mundo. Mais de 3,8 milhões de brasileiros se dizem seguidores da religião. Contando os simpatizantes, o número pula para 30 milhões. Esse talvez seja o principal legado do médium no Brasil: tornar a religião acessível, conhecida e respeitada.
Os brasileiros logo reconheceram a dimensão do médium. Em 2006, a revista Época decidiu escolher o maior brasileiro da história. A publicação formou uma comissão com 33 personalidades notáveis, que ia do ex-presidente Fernando Henrique ao ator Paulo Autran, para escolherem o agraciado. Deu empate entre o escritor Machado de Assis e o político e diplomata Ruy Barbosa. A redação se viu obrigada a votar também, e o escolhido foi Barbosa. Em paralelo, Época criou uma enquete online para dar voz aos leitores na questão. A revista colocou no site uma lista de 50 nomes pré-selecionados. 
O médium não estava entre as sugestões oferecidas pela redação. Mas a votação previa um espaço em branco para que o leitor elegesse outras pessoas. Com essa brecha, o azarão Chico Xavier assumiu a ponta da eleição e terminou em primeiro lugar, com 36% dos votos, o dobro do segundo colocado, Ayrton Senna.
Chico também venceu o concurso O Maior Brasileiro de Todos os Tempos, promovido pelo SBT ao longo de 12 programas em 2012. Para chegar ao posto, o mineiro deixou para trás Irmã Dulce, Princesa Isabel, Oscar Niemeyer e Juscelino Kubitschek. Chico, no programa final, foi representado pelo amigo Saulo Gomes, o jornalista que lhe convenceu a dar a entrevista para o Pinga-Fogo.
Desde 2002, o mineiro calou-se, mas deixou um amplo e fértil terreno para outros espíritas trilharem seu caminho. Chico não deixou herdeiros diretos. Na Casa da Prece, em Uberaba, ele era o único médium. Mas a semente estava plantada. A cidade tinha cerca de cem centros espíritas no ano da sua morte. No vácuo de Chico, nomes como Divaldo Pereira Franco puderam consolidar suas carreiras. 
Divaldo é o maior missionário do espiritismo. Aos 89 anos, quase 70 deles dedicados à doutrina, percorreu os cinco continentes e milhares de cidades brasileiras para divulgar a religião por meio de palestras e entrevistas, sendo o principal responsável pela abertura de novos centros e pelo crescimento do movimento fora do Brasil. Achou conforto nos espíritos ainda criança, quando dois irmãos morreram. Em 1947, aos 20 anos de idade, fundou um centro espírita em Salvador.
Começou a psicografar mensagens ainda na adolescência. O primeiro livro, Messe de Amor, só seria publicado em 1964, quando Divaldo já tinha quase 40 anos. Mas depois disso deslanchou: foram mais de 250 títulos, alegadamente guiados por mais de 200 espíritos. Vendeu 8 milhões de exemplares, com tradução para quase 20 idiomas. Parte do sucesso se explica pela versatilidade. Nos seus textos, Divaldo explorou vários estilos, tendo publicado contos, romances, poemas e crônicas. Os temas também foram plurais: há livros psicológicos, doutrinários, históricos e até mesmo infantis.
Divaldo diz que recebe mensagens de uma mentora chamada Joanna de Ângelis, espírito que teria um talento especial para reencarnar em pessoas que testemunharam fatos históricos. Em suas vidas passadas, Joanna teria sido uma das mulheres que acompanhavam Jesus no momento da crucificação, a fundadora de uma ordem católica no século 13, uma poetisa mexicana no século 17 e mártir da independência da Bahia em 1822.
Com a ajuda de Joanna, Divaldo diz ter escrito os livros Autodescobrimento, de 1995, e Triunfo Pessoal, de 2002, sucessos recentes de uma série psicológica em que o médium explora uma abordagem mais próxima da autoajuda. Embora respeitosas à doutrina kardecista, as psicografias do médium baiano estão mais alinhadas a uma nova faceta do espiritualismo, em que os adeptos buscam apoio do plano dos mortos para prosperar e superar os problemas do cotidiano. 
Embora seja conhecido pela psicografia, Divaldo diz possuir talento para clarividência, vidência e psicofonia – a habilidade de falar em nome de espíritos. Além da importância dentro do movimento espírita, Divaldo também é responsável por projetos sociais na cidade de Salvador, onde fundou a Mansão do Caminho, em 1952. 
O mercado editorial espírita deve muito a Chico Xavier. Ele escreveu mais de 400 livros em vida e deixou um catálogo de 491 títulos, incluindo as obras póstumas com coletâneas de textos inéditos. Divaldo e outros autores alinhados à doutrina vendem milhões de exemplares, uma babilônia perto das tiragens médias de 3 mil exemplares dos livros do mercado “laico”. A grande massa de leitores espíritas cultivada por Chico Xavier permitiu, por exemplo, o sucesso de Zibia Gasparetto, uma médium de 90 anos autora de livros supostamente psicografados desde 1958. Ela coleciona mais de 40 títulos, alguns deles traduzidos para o inglês, espanhol e japonês, e acumula mais de 16 milhões de exemplares vendidos. É figura constante nas listas dos best-sellers brasileiros. 
Mas a autora se distanciou da doutrina. Ela já foi kardecista engajada, deixou o movimento e hoje se diz identificada com o termo “espiritualista”, mais genérico que “espírita”, uma palavra que pode ser entendida como sinônimo de “kardecista”. No final dos anos 1960, Zibia fechou o centro espírita que mantinha com a venda de livros e passou a publicar por uma editora própria. Manteve poder sobre seus direitos autorais, uma decisão radicalmente oposta aos ensinamentos de Chico Xavier e que rende críticas até hoje – para os espíritas, o médium não pode ganhar em cima do que teria recebido de graça. Zibia é empresária e comanda uma lucrativa operação familiar que inclui programas de televisão, rádio e palestras – além dos livros. Ela não enxerga conflito ao monetizar o suposto dom mediúnico. Embora enfrente certa oposição, Zibia encontrou sucesso dentro e fora do movimento espírita, e parte da explicação está no teor das obras, que transitam no popular segmento de autoajuda. 
Outro pilar espírita de hoje está em Goiás. Mais precisamente para a cidade de Abadiânia, onde João de Deus promove seus tratamentos sobrenaturais. Estima-se que ele já tenha tratado mais de 9 milhões de pessoas na Casa Dom Ignácio de Loyola, seu quartel-general em Abadiânia. Lá, ele promove sessões de reza e meditação, mas também corta alguns doentes com bisturis, dispensando qualquer anestesia, ou enfia facas ou tesouras nas narinas dos pacientes. Tudo parece ocorrer sob algum tipo de transe, e os voluntários dizem que não sentem dor. João de Deus já teria arrancado até tumores do cérebro de doentes com suas técnicas nada ortodoxas. Quando incorpora o papel de médico, o médium fica com o olhar perdido e fala pouco. Parece fora de si. 
As filas que contornavam os quarteirões de Uberaba agora são vistas em Abadiânia. Ônibus de todo o Brasil estacionam na cidade de 17 mil habitantes que vive em função de atender as caravanas de doentes. São apenas 117 km de Brasília, uma posição privilegiada que ajuda a ampliar a clientela de João de Deus. O médium é um fenômeno no Brasil, mas cerca de 80% dos doentes vem do exterior, onde ele é conhecido como John of GodEm 2012, foi a vez da apresentadora Oprah Winfrey desembarcar em Abadiânia para encontrar o curandeiro e gravar segmento para o seu programa, um dos campeões de audiência nos Estados Unidos. Parte da fama internacional veio após o depoimento da atriz Shirley MacLaine, que diz ter sido curada de um câncer no abdômen com a ajuda do curandeiro.
Divaldo, Zibia e João de Deus podem ter ocupado o espaço que foi todo de Chico Xavier, mas os seguidores ainda aguardam notícias do mineiro. Antes de morrer, Chico afirmou que não se manifestaria logo do mundo espiritual. Mas deixou uma senha, ou seja, um código secreto, para confirmar a autenticidade de mensagens suas quando enfim resolvesse se comunicar direto do plano dos mortos. Ele queria evitar que charlatões anunciassem a chegada de uma mensagem exclusiva sua – o que lançaria qualquer médium ao estrelato. A chave para o contato com Chico no além foi entregue oito anos antes da sua morte ao filho adotivo, Eurípedes Higino dos Reis, ao médico e amigo Eurípedes Tahan Vieira e para a vizinha Kátia Maria. Cada um recebeu uma palavra diferente, um segredo individual, que não deve ser compartilhado nem entre os integrantes do trio. A verdadeira carta enviada por Chico teria necessariamente essas três palavras mágicas. Os fiéis seguem aguardando.

Espiritismo – 11 respostas sobre Chico Xavier

CHICO XAVIER MORREU EM 2002, AOS 92 ANOS, DEIXANDO MAIS DE 400 LIVROS PSICOGRAFADOS. NO ANO PASSADO, QUANDO COMPLETARIA 100 ANOS, ATRAIU 3,4 MILHÕES DE PESAS AOS CINEMAS PARA ASSISTIR AO LONGA BRE SUA VIDA - QUE É, DE FATO, UMA SAGA DIGNA DE FILME. SUA HISTÓRIA INSPIRA MUITAS PERGUNTAS. CONFIRA ALGUMAS RESPOSTAS.

1. Quando Chico Xavier começou a se comunicar com os espíritos? O médium contava que papeava com espíritos desde a infância, na cidade mineira de Pedro Leopoldo: sob protestos do pai e da madrinha, falava com a mãe, morta quando ele tinha cinco anos. Também psicografava textos na lousa da escola e até recebeu menção honrosa num concurso de redação em que teria contado com a ajudinha de um espírito que lhe ditou o texto.
2. Como ele ficou tão conhecido? Chico começou a ganhar fama – e a motivar polêmicas – em 1932, com a publicação de Parnaso de Além-Túmulo, uma coletânea de 259 poemas assinados por nomes como Castro Alves, Augusto dos Anjos e Casimiro de Abreu. Quando ele apareceu numa sabatina no Pinga-Fogo, programa da TV Tupi, em 1971, a transmissão começou às 23h30 e só terminou perto das 3h, com 75% de audiência no estado de São Paulo. A repercussão foi tamanha que a Tupi repetiu a dose numa nova entrevista, transmitida durante quase quatro horas em rede nacional. O líder espírita de óculos grandes, peruca e terno tornara-se um popstar.
3. Quantos livros ele psicografou? Sua obra foi traduzida para quantas línguas? Ao longo de 92 anos, foram 459 livros – nos períodos de maior atividade, chegou a escrever 14 títulos num único ano. Os textos foram traduzidos para 15 línguas, incluindo japonês, grego, tcheco e esperanto. Há também edições em braile.
4. Ele tinha o dom de curar doenças? Há relatos de gente que se curou de enxaqueca, paralisia e outras doenças graças a ele, mas Chico defendia que sua principal tarefa eram os livros. Durante as sessões públicas, limitava-se a distribuir receitas com mensagens de estímulo e, no máximo, indicações de fitoterápicos. Ele nunca foi acusado de exercer ilegalmente a medicina. Em caso de doença grave, recomendava procurar um médico tradicional. Ele mesmo foi operado de um tumor na próstata e buscou solução para a catarata em hospitais comuns.
5. Que escândalos ameaçaram a imagem do médium? 
Em 1944, familiares de Humberto de Campos reivindicaram na Justiça os direitos autorais de textos do escritor que teriam sido psicografados por Chico. Perderam a causa. Em 1958, o sobrinho Amauri Pena Xavier declarou ao jornal Diário de Minas que as obras que ele e o tio psicografavam em Pedro Leopoldo não passavam de resultado da sua criatividade e facilidade para imitar o estilo de poetas famosos. Amauri era alcoólatra, e morreu internado num sanatório. Logo depois do episódio, Chico se mudou para Uberaba. Já em 1986, um jornal local denunciou que policiais e taxistas estariam cobrando por consultas particulares com o médium. Ao que tudo indica, Chico não sabia do esquema.
6. Ele ficou rico? Depois de vender verduras na rua, dar expediente noturno numa fábrica de tecidos e ser balconista de um armazém em Pedro Leopoldo, Chico trabalhou como escriturário até se aposentar por invalidez, em 1963. Viveu com esse dinheiro e com a ajuda de amigos até o final da vida – os direitos autorais de seus livros foram doados, com registro em cartório, para obras assistenciais.
7. Que famosos procuraram sua ajuda? A atriz Nair Bello, a cantora Wanderléa e a escritora de novelas Gloria Perez passaram pelo Grupo Espírita da Prece, o centro que Chico mantinha em Uberaba, buscando notícias de seus filhos mortos. Vanusa, a cantora que recentemente andou escorregando na letra do hino nacional, foi perguntar a Chico se o relacionamento com o também cantor Antonio Marcos tinha jeito. Xuxa e Clodovil recorreram ao médium, assim como Roberto Carlos, que, apesar de ser católico fervoroso, foi ao seu encontro em Uberaba várias vezes. Entre os ex-presidentes da república, Juscelino Kubitschek se envolveu pessoalmente para que a aposentadoria de Chico fosse agilizada, e Fernando Collor de Mello foi visitá-lo três vezes.
8. Quem é Emmanuel? É o guia (ou conselheiro espiritual) de Chico, a quem ele recorria nos momentos de dificuldade. Emmanuel teria ditado a Chico boa parte dos livros psicografados, embora não fosse o único: mais de 200 espíritos teriam se comunicado com o lado de cá por meio das obras escritas por Chico. Em outras vidas, Emmanuel teria sido o senador romano Publius Lentulus e, já no Brasil, o padre Manoel da Nóbrega.
9. Ele previu a própria morte? Mais ou menos. Ele disse que iria “desencarnar” num dia de muita felicidade para o Brasil. Morreu aos 92 anos, às 19h30 de 30 de junho de 2002, data em que a seleção brasileira conquistou o pentacampeonato na Copa do Mundo.
10. O que aconteceu com o centro espírita de Uberaba depois que ele morreu? As sessões de psicografia foram suspensas, e a casa simples onde o médium viveu os últimos anos em Uberaba foi transformada em museu. A entrada é grátis, mas contribuições são bem-vindas. Membros do centro leem o evangelho e ministram passes. No terreno funcionam também uma livraria e uma loja de lembrancinhas, com produtos que exibem a imagem de Chico Xavier. As doações de alimentos e roupas, além da assistência médica e odontológica à população carente, continuam acontecendo graças aos direitos autorais dos livros e às contribuições que foram mantidas.
11. Depois de morto, Chico já deu sinal de vida? Seu filho adotivo, Eurípedes Higino, afirma que não, embora se fale em mais de 200 recados psicografados por médiuns do Brasil inteiro em nome do espírito de Chico Xavier. Antes de morrer, o mineiro teria combinado com o filho, com o médico Euripedes Tahan Vieira e com a amiga Kátia Maria um código secreto para garantir a autenticidade das mensagens. Até agora nenhuma delas passou pelo teste.
• 2 milhões de assinaturas foram recolhidas para a candidatura de Chico ao Prêmio Nobel da Paz, em 1981.
• Há 100 centros kardecistas em Uberaba. Quando Chico se mudou para lá, eram 14.
• 120 mil pessoas foram ao velório de Chico, que durou 48 horas.
ESPÍRITOS QUE FAZEM JUSTIÇA
As cartas de Chico Xavier foram parar nos tribunais: serviram como prova no julgamento de José Divino, acusado de matar com um tiro seu melhor amigo, Maurício Garcez Henrique, de 15 anos, em Goiânia, em 1976. Na carta psicografada pelo médium, Maurício declarava que o disparo fora acidental, o que batia com a versão contada pelo réu – que acabou inocentado.

Inteligência artificial pôs à prova psicografia de Chico Xavier

Redes neurais artificiais analisaram obras do médium, morto há exatos 15 anos. E concluíram: fé à parte, Chico era um fenômeno mesmo.

Francisco Cândido Xavier morreu há 15 anos, deixando para trás mais de 412 livros escritos. Mas ele sempre rejeitou a autoria de todos: a obra seria inteira psicografada, ditada diretamente de espíritos que falavam ao médium.
Com o aniversário de falecimento do líder espírita, uma empresa brasileira resolveu investigar a obra de Chico usando inteligência artificial. Ao longo da vida, ele psicografou livros de vários autores diferentes. A ideia era usar todo o poder de computação para responder duas perguntas: esse autores têm cada um seu estilo próprio? Eles são suficientemente diferentes entre si?
A Stilingue, uma empresa que trabalha com análise de textos via inteligência artificial para “resumir a internet”, encontrando tendências nas redes sociais, resolveu testar como as obras psicografadas seriam analisadas por uma técnica de aprendizado de máquinas chamada Deep Learning.
A partir de grandes quantidades de dados, o computador aprende a criar relações entre eles, sem precisar aprender, por exemplo, o que é um verbo, um adjetivo, um substantivo. Se fosse reconstruir a Bíblia, o computador logo ia aprender que precisa colocar um número antes de cada frase, porque o livro é estruturado em versículos.
A mesma técnica também já foi usada para recriar Shakespeare. Depois de ler milhões de caracteres do dramaturgo, o computador era capaz de escrever sozinho “imitando” o estilo do inglês, sem nunca ter passado por uma aula de literatura. Nem sempre as frases fazem total sentido, mas os tempos verbais e a mania de criar palavras novas mudando o final delas ficam reproduzidos, igualzinho.
No caso de Chico Xavier, o estudo da Stilingue selecionou três dos principais autores psicografados pelo médium: Emmanuel, André Luiz e Humberto de Campos.
Para “alimentar” a rede neural artificial, eles selecionaram três livros de cada autor – que precisam ser enormes, porque a técnica deep learning exige, no mínimo, um milhão de caracteres por autor conseguir aprender com sucesso. “No caso de Humberto de Campos, sentimos um pouco de falta de mais material. Ele é um autor mais desafiador porque escrevia diferentes tipos de texto [contos, anedotas e poesias]”, explica Milton Stiilpen Jr., fundador da Stilingue.
Devidamente treinado, o computador começou a reproduzir os textos. André Luiz, por exemplo, tinha o hábito de colocar falas espaçadas entre blocos de texto maiores, ao invés de criar longos blocos de diálogos.

André Luiz: entidade espírita vs. bot

Este primeiro texto foi psicografado por Chico Xavier
Os encarnados presentes viam tão-somente o corpo de Otávia, dominado pelo sacerdote que lhes era invisível, quase a rebentar-se de soluços atrozes, mas nós víıamos além. A nobre senhora desencarnada postou-se ao lado do filho e começou a beijá-lo, em lágrimas de reconhecimento e amor. Pranto copioso identificava-os. Cobrando forças novas, a genitora continuou:
– Perdoe-me, filho querido, se noutra época induzi o seu coração à responsabilidade eclesiástica, modificando o curso de suas tendências. Suas lutas de agora me atingem a alma angustiada. Seja forte, Marinho, e ajude-me! Desvencilhe-se dos maus companheiros! Não vale rebelar-se. Nunca fugiremos à lei do Eterno! Onde você estiver, a voz divina se fará ouvir no imo da consciência…
Nesse momento, observei que o sacerdote recordou instintivamente os amigos, tocado de profundo receio. Agora que reencontrava a mãezinha carinhosa e devotada a Deus, que sentia a vibração confortadora do ambiente de fraternidade e féé, sentia medo de regressar ao convívio dos colegas endurecidos no mal.
Já este foi criação da inteligência artificial
A primeira vez mais providencial de serviço de sua consciência, a senhora Laura encontrava-se com a presença de alguns, com a sua consciência espiritual e a medicina de amor, acrescentou:
– O controlador de serviço está disposto a escapar com as mesmas expressões de alegria.
A primeira vez mais forte de algum tempo, a senhora de Alexandre prosseguiu a companheira de serviço e considerando a alegria da conversação despediu-se:
– Neste momento, a maioria dos companheiros encarnados estão através de construções destruidoras e desencarnadas. A consciência tem sempre a construção do coração.

Depois de criar três bots capazes de imitar os autores com uma precisão considerável (erro de 22% para André Luiz, 5% para Emmanuel e 32% para o Humberto de Campos), dá para dizer que cada autor tem um estilo razoavelmente marcante e uniforme.
Agora, dá para dizer que eles são diferentes entre si? Ou será que o estilo delata que teriam sido escritos por uma só pessoa? Para fazer o teste, eles decidiram confundir a máquina. Misturaram os textos de diferentes autores. Mandaram o bot do Emmanuel escrever com base na obra do Humberto, o do Humberto imitar o André e assim por diante. Deu errado: a taxa de erro disparou. Os modelos eram incapazes de encontrar os mesmos padrões de estilo de uma entidade espírita nos livros da outra. Os autores são, sim, marcadamente diferentes.
A questão que resta é: há outras formas de explicar o resultado?
Misturar textos de diferentes temas e épocas de um mesmo autor já é suficiente para aumentar a taxa de erro. Mas não tanto assim. “Fizemos um teste com o Paulo Coelho justamente para testar um único autor com diferentes livros e muitos textos. A taxa de erro aumenta – mas mesmo assim continua baixa”, explica Milton. O teste com Paulo Coelho retornou uma taxa de apenas 10%.
Outra possibilidade cética seria a criação consciente e deliberada de Chico Xavier de diferentes personas, uma para cada autor – coisa parecida com o que o escritor Fernando Pessoa fez, com seis heterônimos marcadamente diferentes.
Milton também tinha uma resposta para isso: eles fizeram o teste de deep learning também com Fernando Pessoa. “Faltou quantidade de dados suficiente para atender essa técnica”, responde Stiilpen. A Stilingue não conseguiu acesso fácil e digitalizado à quantidade necessária de material de cada heterônimo de Pessoa. Relembrando, o mínimo necessário para a análise usando deep learning é de 1 milhão de caracteres o que significa, nesse caso, 6 milhões para uma análise de todos os “autores” em questão. E isso só para aquecer.
Graças a esses resultados, a análise textual deve virar um projeto de pesquisa oficial que vai, inclusive, selecionar outras técnicas mais adequadas a autores como Fernando Pessoa e Nelson Rodrigues. Mas, de tudo isso, qual foi o veredito do estudo sobre Chico Xavier?
A psicografia segue como uma questão de fé. Mas se o estudo atesta algo, é a genialidade do médium. Escrever o volume de texto que ele escreveu, com personas comprovadamente distintas, mas uniformes entre si, não precisa nem ser sobrenatural para ser absolutamente impressionante. Ou, como colocou Monteiro Lobato, “Se Chico Xavier produziu tudo aquilo por conta própria, então ele merece ocupar quantas cadeiras quiser na Academia Brasileira de Letras.”
Chico Xavier – A vida. A obra. As polêmicas.
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Afinal, é possível ouvir os mortos?

Para a ciência moderna, não. Mas alguns pesquisadores acreditam que o problema está na ciência, e não em pessoas como Chico Xavier.

Chico Xavier doou todos os direitos autorais dos mais de 400 livros que escreveu em vida. O gesto não era apenas generosidade do médium. Ele dizia que não havia escrito nenhum livro. “Eles escreveram”, repetia. 
De acordo com a ciência, Chico não poderia falar com os mortos, claro. Tudo teria sido produzido pelo seu próprio cérebro. Se ele ouvia vozes, eram vozes produzidas por sua mente. Afinal, a ciência mostra que a consciência (a mente, ou a alma) é fabricada pelo cérebro e está confinada nele. Ou seja, quando o corpo morre, a consciência desaparece. Não existem hipóteses científicas que sustentem a concepção de algum tipo de alma que sobreviva à morte.  
Mas, diante do acúmulo de casos como o de Chico Xavier, que não foi explicado pelas leis da natureza ou considerado categoricamente como fraude, um grupo de cientistas decidiu questionar a ciência – e não os médiuns. A conclusão dos pesquisadores está no livro Irreducible Mind (“Mente Irredutível”, sem tradução para o português). A obra parte da lógica de que fenômenos como a mediunidade, a telepatia e experiências de quase-morte são indícios de que o modelo teórico vigente nos meios científicos é incompleto. Os autores defendem uma mudança na forma de encarar casos como o de Chico: tirá-los do campo do folclore e da superstição e analisá-los. Hoje, são ignorados. 
Para o grupo coordenado pelo psiquiatra da Universidade da Virgínia (EUA) Edward Kelly, a ciência vem ignorando um princípio científico básico, o da “falseabilidade”, defendido pelo filósofo Karl Popper. Popper dizia que era muito fácil – e perigoso – ficar catando evidências favoráveis para defender uma tese. Difícil era encontrar o argumento que a desmontaria de vez. Para Popper, todo cientista sério deveria estar sempre procurando um furo na sua tese – e não o contrário. Kelly e seus colegas defendem que a mediunidade pode ser um desses furos – e pode desvendar o mistério da consciência, que instiga filósofos e cientistas há mais de 2 mil anos.
Eles acreditam que parte do problema está em considerar mente e cérebro uma coisa só. Em Irreducible, os pesquisadores propõem que o cérebro seja encarado como um aparelho de TV. A consciência seriam seus programas. Um defeito na TV pode alterar a qualidade da imagem, mas não necessariamente o conteúdo dos programas – eles não existem apenas dentro daquele aparelho. Ou seja, sem a TV, não podemos enxergar nosso seriado favorito, mas ele existe mesmo assim. Só não pode ser assistido. Funcionaria de um jeito parecido com a consciência: dependemos do cérebro para percebê-la, mas ela não está, segundo a proposta, confiada dentro do aparelho (o cérebro). E isso garantiria sua sobrevida além do corpo, abrindo a possibilidade de explicar a ideia de que a consciência segue vagando por aí após a morte e pode se comunicar com os outras consciências, vivas ou não. Kelly e os colegas não sabem dizer se estão certos nem têm provas irrefutáveis a favor dessa concepção. Eles oferecem a hipótese apenas para sensibilizar seus colegas da psicologia e da neurociência. Querem que os cientistas tradicionais questionem suas convicções e prestem mais atenção em fenômenos hoje ignorados, como a mediunidade. 
Os argumentos a favor dessas teorias ganham força com alguns estudos, como uma pesquisa publicada há dois anos na prestigiada revista científica Plos One. Em parceria com a Universidade Federal de Juiz de Fora e com a Universidade da Pensilvânia, o psicólogo e neurocientista Julio Peres, da USP, viajou aos Estados Unidos com dez médiuns brasileiros. Os voluntários eram destros e tinham entre 15 e 47 anos de experiência mediúnica – cada um com, em média, 18 psicografias por mês. Nenhum deles tinha transtorno mental diagnosticado. No Centro de Radiologia e Medicina Nuclear da Universidade da Pensilvânia, na Filadélfia, os voluntários receberam uma substância radioativa para captar a atividade cerebral por meio de um exame de imagem chamado spect. Peres e Andrew Newberg, o cientista americano conhecido por estudar o cérebro de freiras rezando e monges em meditação, avaliaram as diferenças nas imagens do cérebro dos voluntários em dois momentos: durante a psicografia e fora do estado de transe, escrevendo um texto comum, de autoria “própria”. 
Os resultados mostraram uma diferença significativa. Em transe, enquanto supostamente escreviam guiados pela voz ou pela mão dos espíritos, os médiuns apresentaram níveis mais baixos de atividade no lobo frontal, que está associado à razão, à linguagem e ao planejamento. “Esse resultado possivelmente reflete a ausência de consciência na psicografia”, explica Peres. Enquanto escreviam normalmente, essas regiões cerebrais, que costumam estar alertas durante uma tarefa intelectual, como a escrita, voltavam ao normal. 
Os cientistas resolveram, então, comparar o conteúdo dos dois textos. Se era verdade que o cérebro estava com a capacidade de raciocínio limitada durante a psicografia, os pesquisadores levantaram a hipótese de que os textos produzidos em transe refletissem isso e fossem mais pobres. Para a surpresa geral, ocorreu justamente o contrário. O conteúdo das psicografias era mais complexo e elaborado do que os textos feitos em estado pleno de consciência.  Entre os médiuns mais experientes, essa variação era ainda mais perceptível. “Os médiuns referem que ‘a autoria dos textos psicografados foi dos espíritos comunicantes e não pode ser atribuída a seus próprios cérebros’. Essa é, sim, uma hipótese plausível entre as várias possibilidades de compreendermos esses primeiros achados”, diz Peres.  
Opiniões à parte, o estudo tem pelo menos uma conclusão clara: mesmo que tudo seja obra da mente dos médiuns, como diz a ciência, boa parte deles não tem consciência disso.

3 cartas inacreditáveis que Chico Xavier psicografou

Analisamos três cartas psicografadas por Chico Xavier em busca de elementos que o médium não poderia saber sobre os mortos. E ele se saiu muito bem.

Durante mais de 60 anos, Chico Xavier confortou pessoas desconsoladas de todo o Brasil em busca de notícias de seus parentes mortos. Teria mantido comunicação com milhares de espíritos e psicografado suas mensagens, recheadas de informações íntimas, nomes de parentes e condições da morte que só as famílias reconheciam.
Veja abaixo três cartas cheias de detalhes sobre a vida dos mortos, que o médium não teria como saber.

1. O menino que se despediu da família

Morto aos 3 anos, depois de cair de bicicleta, o pequeno Rangel teria escrito uma carta à mãe, Célia, e ao pai, Aguinaldo, psicografada por Chico Xavier, um ano após sua morte. Como morreu antes de ser alfabetizado, sua carta traz uma caligrafia de traços infantis, de quem começa a desenhar as letras. A mãe lembra que, antes de Chico ler a carta de Tetéo, em uma reunião no Centro Espírita da Prece, em Uberaba, um médium ao seu lado lhe disse: “Seu filho está aqui, correndo, e a toda hora vem lhe abraçar. Agora, ele está escrevendo a carta com a ajuda do avô”, informação mencionada na mensagem escrita por Chico.
Trecho 1
Querido papai Aguinaldo e querida mamãe Célia, com vovó Lia. Sou eu o Tetéo (A) . Estou com o meu avô Lico (B) e com a minha tia Gilda (C). Vovô me auxilia a escrever porque estou aprendendo. Estou vendo a tia Lé (D)
Trecho 2
Eu estou vivo e vou crescer. Estou aprendendo a escrever só para dizer ao seu carinho e ao carinho da mamãe Célia que não morri (E).
Trecho 3
Vou aprender muitas coisas e muitas lições para saber escrever melhor. Mas já estou mais adiantado que a Mariana (F) e creio que o Aguinaldinho (G) ficará satisfeito. Papai, mamãe, Vó Lia e Tia Lé, não posso escrever mais porque fiquei cansado de fazer letras. Mas quando eu puder, voltarei. Estou com muitas saudades (…)
Informações que Chico desconhecia
A. O apelido do pequeno Rangel era Tetéo.
B. Vô Lico era como Tetéo chamava o seu avô materno, Manoel Diniz, morto em 1979, que presidiu o Centro Espírita Luiz Gonzaga, fundado por Chico, em Pedro Leopoldo.
C. Tia Gilda era uma tia do pai de Tetéo, Aguinaldo. Ela morreu em 1954. O próprio Aguinaldo se lembrava pouco da tia, que faleceu quando ele tinha apenas 4 anos. Tetéo, claro, não a conheceu.
D. Tia Lé era uma amiga da família que estava na reunião no dia que supostamente o espírito de Tetéo teria escrito a carta.
E. Célia, a mãe de Tetéo, fazia perguntas a si mesma, no íntimo, sem compartilhá-las, sobre a morte do caçula. Uma delas era a dúvida se Tetéo continuaria seu desenvolvimento, interrompido tão precocemente – pergunta respondida na mensagem.
F. Mariana era a irmã de Tetéo. Chico podia até saber disso porque era amigo da família, mas Tetéo menciona uma característica da irmã só conhecida pelos mais próximos: que a garota não era tão aplicada nos livros.
G. Aguinaldinho era o irmão mais velho de Tetéo, conhecido por ser o CDF da família, com quem Tetéo se compara na carta.

Uma investigação: Chico Xavier

Há 100 anos nascia o homem que faria brasileiros de todos os credos acreditar na vida após a morte. Que mudaria a vida de famílias desconsoladas. E que colocaria a ciência atrás de respostas para as vozes do outro mundo. o mito Chico Xavier gerou tudo isso. mas o que gerou o mito chico xavier?

Gisela Blanco. Com reportagem de Hellen Samantta em Foz do Iguaçu
Até hoje chegam chegam cartas a Uberaba, Minas Gerais, endereçadas a Chico Xavier. Vêm pelo correio ou são jogadas por cima do muro do centro em que ele trabalhava. Parece que seus autores não se lembram de que Chico não está lá – morreu há 8 anos. Quer dizer, o homem morreu. O mito não. Normal para quem, como ele, teve trajetória de superstar. Nos anos 80, mais de 100 pessoas faziam fila à sua porta todo dia. Nos 90, foi destinatário recordista de cartas no Brasil: 2 mil por mês. Seus mais de 450 livros venderam 25 milhões de cópias. E sua influência ajudou a tornar o Brasil o maior país kardecista do mundo, com 20 milhões de fiéis. Em 2 de abril, Chico completaria 100 anos. Nem após sua morte outro médium despertou tamanho fascínio. O que Chico tinha de diferente? A SUPER investigou. E achou uma fórmula com 3 ingredientes. Comecemos por aquele que foi a origem de toda essa história: as cartas dos mortos.
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Há 100 anos nascia o homem que faria brasileiros de todos os credos acreditar na vida após a morte. Que mudaria a vida de famílias desconsoladas. E que colocaria a ciência atrás de respostas para as vozes do outro mundo. o mito Chico Xavier gerou tudo isso. 

Os poetas que Chico Xavier psicografou

Quando Chico publicou um livro de poemas de autores mortos, criou-se um dilema: as famílias dos escritores deveriam receber pelos textos psicografados?

Nos finais de tarde, Chico Xavier costumava frequentar o Açude do Capão, um local nos arredores de Pedro Leopoldo. O médium passeava pela área para meditar e orar na sombra das árvores. Numa tarde de 1931, Chico contou que viu a figura de um homem simpático, que vestia túnica sacerdotal e que estava rodeado por fortes raios luminosos. Os dois passaram a conversar, e o espírito disse que se chamava Emmanuel.
A figura da roupa brilhante perguntou se Chico estava disposto a colaborar com a difusão da filosofia espiritualista. Emmanuel (pronuncia-se “Emmânuel”) garantiu que o jovem seria amparado por bons espíritos, mas, caso aceitasse a missão, teria de demonstrar disciplina para dar conta de uma missão ousada: psicografar 30 livros enviados do plano espiritual. Segundo a história que Chico repetiu incontáveis vezes ao longo da vida, foi assim que ele começou a conviver com o seu guia.
Livros e entrevistas de Chico Xavier – e de outros autores espíritas – indicam quem Emmanuel teria sido em algumas das suas encarnações. O espírito que guiou o médium mineiro até seus últimos dias de vida teria vindo à Terra como um senador romano chamado Publius Lentulus Cornelius, que teria lutado contra a corrupção em Roma, encontrado Jesus Cristo pessoalmente e morrido vítima do vulcão Vesúvio, no ano de 79 (tal figura, apontam os historiadores, jamais existiu).
Seja como for, Emmanuel teria voltado ao mundo dos vivos um pouco mais tarde, no ano de 131, como um escravo de origem judaica, preso e condenado à morte por ser fiel a Jesus. Mas a sua passagem mais ilustre pelo planeta teria sido como Manuel da Nóbrega, o padre português responsável pela catequização de indígenas brasileiros, também fundador da cidade de São Paulo.
Teria sido nessa encarnação que o orientador de Chico ficou apaixonado pelas terras tupiniquins. Em sua última temporada na Terra, Emmanuel teria sido Padre Amaro, humilde religioso que viveu no Pará entre os séculos 19 e 20, tendo contato com o expoente espírita Bezerra de Menezes quando esteve no Rio de Janeiro.
Chico, enfim, partiu para a missão de produzir 30 livros. Mas teve de superar uma série de graves problemas antes de iniciar a tarefa. Em dezembro de 1931, o médium sentiu um desconforto no olho esquerdo, como se grãos de areia arranhassem o globo ocular a cada movimento. Ao consultar um especialista em Belo Horizonte, foi diagnosticado com uma catarata obscura e inoperável. Aos 21 anos, ele estava praticamente cego de um olho, com risco de perder a visão também do outro.
O tratamento era doloroso: injeções de corticoide diretamente no local afetado, as quais provocavam incômodas hemorragias. Outro obstáculo era encontrar tempo para psicografar. A madrasta Cidália Batista tinha morrido meses antes. Chico prometeu a ela cuidar dos irmãos e ajudar o pai a sustentar a casa, o que ocupava seu dia por inteiro. “Fiquei com 14 crianças, irmãos menores e sobrinhos. Não conseguia assumir o compromisso [de psicografar] porque os problemas domésticos eram muitos”, relembrou Chico Xavier décadas mais tarde.
Diante das dificuldades, o médium se viu na companhia de um Emmanuel implacável. Chico disse que o espírito não aceitou seu repouso de dois dias enquanto tratava os ferimentos no olho esquerdo. O médium contou que, nesse dia, Emmanuel perguntou por que Chico não estava escrevendo. Quando alegou que o olho estava doente, ouviu de seu orientador uma lição dura: “E o outro, o que está fazendo? Ter dois olhos é um luxo”.
São inúmeros os relatos de Chico que revelam um guia rígido, cujo papel principal não era oferecer consolo, mas cobrar disciplina para que as obrigações espirituais fossem cumpridas. Depois que um impactante caso de obsessão – irmãs que reagiam violentamente diante dos frequentadores do centro espírita – provocou uma debandada de adeptos, Chico sentou muitas noites sozinho à mesa para realizar sessões. Tinha recebido uma ordem de Emmanuel para manter as leituras religiosas, fundamentais não só para os vivos, mas também para os mortos ali presentes. Quando o médium cogitava desistir de sua missão, o guia, segundo Chico, se enfurecia.
No início dos anos 1930, Chico Xavier ainda era um médium desconhecido de uma pequena cidade do interior de Minas Gerais, sem grandes conexões com líderes do movimento espírita do Rio de Janeiro e de São Paulo. Essa situação mudou assim que o médium começou a psicografar poemas supostamente enviados de outro plano por escritores já falecidos, o que despertou interesse da cúpula da Federação Espírita Brasileira.
O grande salto na carreira de Chico foi dado com a publicação de Parnaso de Além-Túmulo, seu primeiro livro, em julho de 1932. A obra era uma coletânea de 60 poemas atribuídos a 14 autores mortos – nove brasileiros, quatro portugueses e um anônimo. Entre eles estavam nomes famosos como Augusto dos Anjos, Casimiro de Abreu, Cruz e Sousa, Olavo Bilac, Castro Alves e Artur Azevedo.
(FEB/Divulgação)
A temática da antologia girava em torno das visões dos poetas sobre como era a vida após a morte. Responsável pela publicação, Manuel Quintão, à época presidente da federação, logo tratou de defender a veracidade dos poemas psicografados pelo “rapaz de 21 anos, um quase adolescente”, dizendo no prefácio que nem mesmo o mais intelectual dos literatos era capaz de imitar tal produção.
Na abertura do livro, Chico se apresentou aos leitores. Esclareceu que estudou apenas até o fim do curso primário, tendo aprendido no período não mais que alguns “rudimentos de aritmética, história e vernáculo”. Ele garantiu que nunca invocou os espíritos dos poetas famosos, tendo recebido a série de poesias “a contragosto”, sem ter feito qualquer esforço intelectual. O médium explicou que, ao colocar os escritos no papel, sentia a sua mão impulsionada por outra. Outras vezes copiava os textos de livros “fantasmagóricos”, que só existiam no além. Também escrevia versos ditados ao seu ouvido. Afirmou que fluidos elétricos e vibrações indefiníveis invadiam seu corpo.
“Certas vezes, esse estado atingia o auge, e o interessante é que parecia-me haver ficado sem o meu corpo, não sentindo, por momentos, as menores impressões físicas. É o que eu experimento fisicamente quanto ao fenômeno que se produz comigo”, escreveu. O médium fazia questão de deixar claro que não era autor dos poemas, apenas um intermediário. Para mostrar que não escrevia em busca de dinheiro, seguindo os princípios da mediunidade gratuita, Chico abriu mão dos direitos do livro, oferecendo tudo à federação espírita para financiar ações sociais e o trabalho de divulgação da doutrina.
Humberto de Campos, membro da Academia Brasileira de Letras, falou sobre o trabalho de Chico em dois artigos publicados pelo Diário Carioca logo após o lançamento. “Os poetas de que ele é intérprete apresentam as mesmas características de inspiração e expressão que os identificavam neste planeta. O gosto é o mesmo e o verbo obedece, ordinariamente, à mesma pauta musical”, escreveu. Depois de apontar semelhanças entre os originais e as psicografias, o escritor foi taxativo: Parnaso de Além-Túmulo merecia a atenção dos estudiosos, para se descobrir o que há nele de “sobrenatural ou de mistificação”.
Parnaso foi uma publicação ousada – talvez a mais ousada entre os mais de 400 livros que Chico Xavier viria a publicar em quase 70 anos de carreira. No entanto, o debate em torno da obra explodiu mesmo em 1935, após a chegada da segunda edição, quase três vezes maior, com 173 poemas atribuídos a 32 autores falecidos. Entre eles estava o próprio Humberto de Campos, que tinha morrido em dezembro do ano anterior. A polêmica dessa vez foi enorme. Pela primeira vez, o nome do médium mineiro surgia nos jornais mais importantes do Brasil, em meio a debates acalorados.
Cada um dos poemas foi incessantemente examinado pelos críticos, sempre ávidos em encontrar indícios de plágio, de fraude. Esse objetivo, no entanto, logo se mostrou complicado. Críticos ortodoxos, que consideravam a ideia da sobrevivência do espírito um delírio religioso, classificaram a obra como pastiche, mera cópia do estilo literário dos autores. Para eles, Chico Xavier não passava de um imitador exímio do conteúdo e da forma dos falecidos. Mas como provar isso?
O caso do médium que psicografava escritores mortos despertou interesse de jornalistas. Em maio de 1935, o repórter Clementino de Alencar, do jornal O Globo, viajou até Pedro Leopoldo no intuito de desmascarar Chico. O jornalista acompanhou por mais de um mês o trabalho do jovem mineiro e realizou várias entrevistas com moradores da cidade, espíritas ou não. Também remexeu em arquivos de mensagens manuscritas por Chico e participou das sessões realizadas no centro Luiz Gonzaga. Na primeira delas, viu o jovem médium escrever com desenvoltura – de trás para frente – uma mensagem em inglês.
Viu surgir em folhas de papel dois poemas atribuídos ao espírito de Olavo Bilac e outro a Augusto dos Anjos. Desconfiado, o repórter testou Chico Xavier com perguntas difíceis sobre sistema monetário. As respostas vieram em longos e elaborados textos assinados por economistas mortos. Nas prateleiras da casa onde Chico morava com os irmãos, não havia livros dos escritores e poetas presentes em Parnaso. A cidade de Chico sequer contava com biblioteca.
(Montagem sobre Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
As impressões de Clementino de Alencar foram publicadas semanalmente no jornal, de modo que os leitores puderam acompanhar passo a passo as investigações. No final da série de reportagens, o jornalista descartava a hipótese de charlatanismo. “Torna-se cada vez mais remota a ideia de fraude grosseira que tenha porventura surgido com as primeiras notícias relativas ao jovem médium de Pedro Leopoldo”, afirmou. Para Chico, o material produzido pelo jornal O Globo, com grande circulação em todas as regiões do país, serviu como defesa e também como divulgação.
Outros interessados no caso também viram suas crenças abaladas diante das habilidades do médium de Pedro Leopoldo. Nos anos seguintes, a polêmica sobre Parnaso seguiu ganhando páginas dos jornais. Em 1939, Agripino Grieco, crítico literário conhecido daqueles tempos, acompanhou uma sessão de psicografia realizada na sede da federação espírita em Belo Horizonte. Ficou surpreso com o que viu.
“Como crítico literário, não pude deixar de impressionar-me com o que realmente existe do pensamento daqueles dois autores”, disse em entrevista ao Diário da Tarde, ao analisar os escritos atribuídos a Augusto dos Anjos e Humberto de Campos. No jornal Correio do Povo, em 1941, o poeta gaúcho Zeferino Brasil – que, depois de morto, também teria poemas escritos pelas mãos de Chico – concluiu: “Ou as poesias em apreço são de fato dos autores citados e foram realmente transmitidas do Além ao médium que as psicografou, ou o Sr. Francisco Xavier é um poeta extraordinário, genial mesmo, capaz de produzir e imitar assombrosamente os maiores gênios da poesia universal”.
(Montagem sobre Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
O jornalista e escritor Mário Donato, em artigo no jornal O Estado de S. Paulo em 1944, estava convencido que não era Chico quem escrevia os poemas. Na falta de explicações científicas sobre a psicografia, decidiu colocar tudo na conta do milagre. “É milagre, e o milagre, não explicando nada, explica tudo. Pois se não admitirmos que o caso é milagroso, temos que levar o Chico Xavier à Academia Brasileira de Letras”, escreveu. Melo Teixeira, psiquiatra e professor da Universidade Federal de Minas Gerais, que conhecia Chico pessoalmente, não acreditava na tese de pastiche.
“Fazê-lo, como Chico Xavier o costuma, de improviso, numa elaboração e redação instantâneas, sem segundos sequer de meditação para coordenar ideias, passando em sucessão ininterrupta da prosa ao verso, da página de ficção para a de filosofia, ou moral (…) é alguma coisa de inexplicável, que não está ao alcance de qualquer imitador de estilos ou amadores de contrafação literária”, escreveu no Diário da Tarde, jornal mineiro, também em 1944. Para Teixeira, para fazer um pastiche digno, seria preciso dedicação exclusiva, edições constantes, além de mil e um retoques.
Os vários anos de debates em torno de Parnaso fizeram Chico Xavier famoso. Foi devido aos relatos sobre as assombrosas capacidades mediúnicas do mineiro que as primeiras caravanas do Rio e de São Paulo começaram a chegar a Pedro Leopoldo, enchendo as sessões antes vazias no centro espírita Luiz Gonzaga.
Em muitas noites, mais de 300 pessoas eram atendidas. Chico indicava aos doentes as homeopatias que garantia terem sido receitadas na hora pelo espírito do médico Bezerra de Menezes, o ícone do espiritismo brasileiro do século 19, falecido em 1900. Chico Xavier psicografava centenas de mensagens, segundo ele, enviadas por mortos para consolar os familiares. O médium pedia aos visitantes que fizessem trabalhos de caridade. E difundia o credo espírita por meio dos livros que indicava aos interessados.
Chico, porém, só conseguiu alcançar a disciplina exigida pelo guia Emmanuel quando o emprego no armazém de José Felizardo ficou pela bola sete. O dono do mercado havia sofrido uma trombose no cérebro, e a doença afetou as finanças do empório. Com o salário sofrendo baixas, Chico teve de procurar alternativas de sustento e encontrou a vaga temporária na Inspetoria Regional do Serviço de Fomento da Produção Animal, na chamada Fazenda Modelo.
O armazém de José Felizardo acabou falindo no segundo semestre de 1935. Rômulo, o administrador da Fazenda Modelo, era espírita praticante e frequentava o centro Luiz Gonzaga. Com a falência do mercadinho, agarrou a oportunidade de contratar Chico, que virou datilógrafo do governo. O médium passava os dias escrevendo relatórios sobre cavalos e bois no novo emprego. Rômulo era um chefe disciplinador que estava interessado no trabalho do médium dentro e fora da repartição.
Tanto que passou a convocar Chico para as sessões espíritas que ocorriam na sua casa todas as quartas-feiras à noite. Além disso, ele organizou uma sala na própria residência onde o médium cumpria um terceiro turno, psicografando os livros ditados do além.
Com o ambiente propício para a concentração, novas edições de Parnaso surgiram com mais poemas inéditos. Alguns dos textos já publicados foram revisados e até mesmo retirados da obra por orientação, segundo o médium, de espíritos que atuavam como editores. O principal deles era Emmanuel, a quem Chico dizia recorrer quando tinha dificuldade para entender mensagens ditadas por autores mortos, recebendo do seu guia instruções que o ajudavam a desenvolver seu talento. A sexta e definitiva versão de Parnaso de Além-Túmulo só seria publicada em 1955, contendo 259 poemas de 56 autores diferentes.
As semelhanças com o tipo de linguagem dos supostos autores surpreendem. Um desses casos é o do poeta Augusto dos Anjos. Filho de família de proprietários de engenhos, ele nasceu no Engenho Pau d’Arco, na Paraíba, em 1884. Formado em Direito, nunca exerceu a profissão. Morando no Rio de Janeiro, começou a se dedicar às faculdades de português e geografia. Em vida, só publicou um livro, intitulado Eu, em 1914, misturando características do parnasianismo e do simbolismo. Morreu de pneumonia logo depois, aos 30 anos.
Nos textos atribuídos ao falecido, Chico Xavier reproduz, tal como Augusto dos Anjos, os versos com dez sílabas poéticas, as aliterações (repetição de fonemas) e coliterações (repetição de fonemas de um mesmo grupo fonético). Também introduz comparações a partir de apostos ou vocativos, entre outros detalhes observados pelos especialistas.
Outro destaque de Parnaso são os poemas atribuídos ao português Antero de Quental. Nascido em Ponta Delgada, em 1842, o escritor foi um dos poetas realistas mais famosos do seu país. Pertenceu à Geração de 70, um movimento acadêmico que queria renovar os ânimos intelectuais no século 19, da política à literatura. Antero escreveu poesia e ensaios filosóficos com influência de Hegel e do positivismo. Sofria com transtorno bipolar, sendo sua carreira marcada por uma mudança de visão: era no começo idealista e terminou pessimista. Deprimido, cometeu suicídio em 1891.
Nas mãos de Chico, Quental voltou com sua poesia filosófica, conservando o mesmo tipo de acentuação e ainda o estilo de rimas, de adjetivo com substantivo. Os poemas fazem uso de enjambements, isto é, um encadeamento sintático entre versos. Analistas destacam ainda a repetição de termos, o predomínio de acentos na sexta e décima sílabas poéticas, bem como a angústia existencial como tema recorrente. No poema a seguir, porém, surge uma característica comum à obra psicografada de Chico Xavier. O médium é bem mais religioso que seus autores mortos. Veja.
Deus
antero de quental, por Chico Xavier

Quem, senão Deus, criou obra tamanha, 
O espaço e o tempo, as amplidões e as eras, 
Onde se agitam turbilhões de esferas, 
Que a luz, a excelsa luz, aquece e banha?

Quem, senão ele fez a esfinge estranha
No segredo inviolável das moneras, 
No coração dos homens e das feras, 
No coração do mar e da montanha! 

Deus!… somente o Eterno, o Impenetrável, 
Poderia criar o imensurável
E o Universo infinito criaria!…

Suprema paz, intérmina piedade, 
E que habita na eterna claridade
Das torrentes da Luz e da Harmonia! 

À Morte
antero de quental, em vida

Ó Morte, eu te adorei, como se foras
O Fim da sinuosa e negra estrada, 
Onde habitasse a eterna paz do Nada
As agonias desconsoladoras.

Eras tu a visão idolatrada
Que sorria na dor das minhas horas, 
Visão de tristes faces cismadoras, 
Nos crepes do Silêncio amortalhada.

Busquei-te, eu que trazia a alma já morta, 
Escorraçada no padecimento, 
Batendo alucinado à tua porta;

E escancaraste a porta escura e fria, 
Por onde penetrei no Sofrimento, 
Numa senda mais triste e mais sombria.
Outro dos autores que Chico dizia receber era Cruz e Sousa, o principal poeta do simbolismo brasileiro. Nascido em 1861, em Nossa Senhora do Desterro, hoje Florianópolis, era filho de ex-escravos e cresceu sob a proteção dos antigos proprietários, que bancaram sua educação. Sofreu a vida inteira preconceito por ser negro. Chegou a ser nomeado promotor, mas não pôde assumir a função por conta da cor da pele. Seus livros mais célebres foram Missal e Broquéis, que o consagraram como fundador do simbolismo brasileiro, com poesias musicais, pessimistas, cheias de metáfora e com linguagem rebuscada.
Casou-se e teve quatro filhos, que morreram todos de tuberculose, doença que também levou o poeta, aos 36 anos. Os textos publicados por Chico mantêm o tom religioso e a ideia de sofrimento redentor que marcam a última fase da carreira de Cruz e Sousa. Neles a morte segue como tema recorrente, bem como a preocupação com as pessoas desassistidas e marginalizadas. Os especialistas apontam ainda as semelhanças nos versos musicais, os sonetos líricos com foco na subjetividade, a linguagem rebuscada e a sinestesia, recurso que associa dois ou mais sentidos.
(Montagem sobre Wikimedia Commons/Wikimedia Commons)
O escritor, jornalista e político maranhense Humberto de Campos, responsável por esquentar a polêmica em torno de Parnaso, nasceu na cidade de Miritiba, hoje chamada Humberto de Campos, em 1886. Fez sucesso com crônicas e entrou para a Academia Brasileira de Letras graças à sua produção poética, bastante valorizada na época. Como jornalista, escreveu para diversos jornais do país. Caiu nas graças do público ao escrever contos humorísticos sob o nome Conselheiro XX. A produção, no entanto, não agradou a crítica literária, que a considerou literatura rasa.
O auge da popularidade veio pouco antes da morte, quando, gravemente enfermo, escreveu sobre si mesmo. Faleceu em 1934, aos 48 anos, como um dos escritores mais lidos do Brasil. Mas teria voltado à ativa pelas mãos do médium de Pedro Leopoldo, em crônicas semelhantes às escritas em vida. Textos que expõem um fato acontecido, fazem analogia a caso lendário, histórico ou literário, e que contêm uma conclusão em tom moralizante. Há nos textos atribuídos a Humberto o mesmo tom espontâneo, o humor e a malícia refinada. Também estão lá a erudição e o culto pela elegância, assim como o interesse pelo popular.
Enquanto jornalistas, críticos literários, religiosos e intelectuais dissecavam os poemas de Parnaso de Além-Túmulo, Chico Xavier mantinha o foco nas psicografias. O livro de estreia, no fim das contas, era apenas o primeiro dos 30 que, segundo Chico, Emmanuel havia encomendado. O médium agora demonstrava interesse em escrever histórias como as psicografadas por uma médium pioneira chamada Zilda Gama.
Chico era grande admirador do trabalho de Zilda. Depois de ler com entusiasmo uma novela atribuída ao espírito do poeta, romancista e dramaturgo francês Victor Hugo, ele queria ampliar seu leque de estilos. Além de poemas, de crônicas e de mensagens instrutoras, o mineiro queria receber do plano espiritual romances empolgantes como os que Zilda colocava no papel.
Nascida em 11 de março de 1878, no interior de Minas Gerais, Zilda Gama teve uma vida conturbada, assim como Chico. Aos 24 anos, com a morte dos pais, teve de cuidar de cinco irmãos e de cinco sobrinhos. Era uma professora dedicada, diretora da escola em que trabalhava. Certo dia, quando orava sozinha, disse ter percebido a presença de um espírito que a incentivava a escrever. Assim que pegou o lápis, teria colocado no papel uma mensagem do próprio pai, que a consolava e avisava que uma missão de grande importância estava reservada para ela. Era o início da sua carreira como médium psicógrafa.
Em 1912, aos 34 anos, Zilda escreveu seus primeiros textos assinados por Allan Kardec, falecido em 1869. Ela assinaria outros supostamente enviados pelo pai do espiritismo, mensagens compiladas no livro Diário dos Invisíveis, de 1929. Mas a grande empreitada de Zilda seria iniciada em 1916, quando ela contou ter sido avisada por seus orientadores que escreveria uma novela ditada por Victor Hugo, morto em 1885 e autor de Os Miseráveis e O Corcunda de Notre-Dame.
O livro Na Sombra e na Luz, de 1917, se passa quase todo no século 19 e ganhou quatro obras como continuação: Do Calvário ao InfinitoRedençãoDor SupremaAlmas Crucificadas. Cada obra narra uma encarnação dos personagens, mostrando a evolução de seres degenerados e sofredores. Essa série é considerada um dos maiores clássicos da literatura espírita. Em 1959, após sofrer um derrame cerebral, Zilda passaria a viver numa cadeira de rodas. A escritora morreu em janeiro de 1969, pouco antes de completar 91 anos.
O primeiro movimento de Chico Xavier na nova direção veio com a publicação do livro Emmanuel, em 1938, definido no subtítulo como “dissertações mediúnicas sobre importantes questões que preocupam a humanidade”. A obra atribuída ao guia espiritual aborda o papel dos médiuns, esclarece pontos da doutrina espírita e busca delinear os ideais que devem nortear o ser humano ao longo da vida.
A primeira parte trata das tradições religiosas e da evolução da fé no contexto histórico, falando da ascendência do Evangelho, das origens do cristianismo em Roma e do catolicismo na Europa moderna. A segunda metade trata de temas científicos e filosóficos à luz da teoria espírita, como a consciência humana, os animais no plano terrestre, a civilização ocidental, a saúde humana, o livre-arbítrio e o modus operandi dos espíritos.
Em 1939, Chico psicografou A Caminho da Luz, livro que faz um retrato da humanidade à luz do espiritismo. A história começa na criação do Universo e avança no tempo para falar de egípcios, hindus, israelitas, chineses, gregos e romanos. O escritor aborda períodos importantes da história, como as Cruzadas na Idade Média, a Revolução Francesa e o descobrimento da América. Personagens de destaque na história são apontados como enviados de Deus, caso de Sócrates e Platão, além das figuras-chave das grandes religiões: Abraão, Moisés, Confúcio, Buda, Jesus, Maomé e Allan Kardec.
Primeiro romance épico de uma série de cinco volumes, Há Dois Mil Anos, de 1940, narra o nascimento do cristianismo a partir da figura do próprio Emmanuel. Como já dissemos, o espírito teria sido, em uma de suas encarnações, um senador da Roma antiga chamado Publius Lentulus Cornelius. O político, segundo a obra de Chico, fora enviado pelo imperador para a Palestina a fim de fiscalizar Pôncio Pilatos, acusado de corrupção, exatamente na mesma época em que Jesus pregava entre os judeus. Na parte mais empolgante do romance, o senador encontra Jesus. Lentulus, porém, teria sido orgulhoso e não dado muita bola para o filho de Deus. Depois, se arrependeu e passou a pregar o cristianismo para se redimir.
Outro romance de fundo histórico escrito pelas mãos de Chico (e assinado por Emmanuel) é Paulo e Estêvão, de 1941. O livro tem como protagonista o apóstolo Paulo e se passa em Jerusalém. A narrativa vai desde quando Paulo empreendeu perseguições a cristãos até o momento de sua conversão. Para todos os efeitos, o livro é o Ato dos Apóstolos, o quinto do Novo Testamento, reescrito pelo espiritismo. O Estevão do título é o espírito Santo Estevão, mártir do cristianismo, que ajuda o apóstolo Paulo ao aparecer em sonhos. Em 1943, Chico publicou o livro Renúncia, que aborda períodos conturbados da história religiosa ocidental, como a criação da Inquisição, a reforma protestante, as perseguições promovidas pelos católicos e a atuação dos jesuítas pelo mundo.
Chico Xavier bateu a meta dos 30 livros encomendados por Emmanuel. Com folga. Entre os mais de 400 livros publicados pelo médium ao longo da carreira, quase 117 são atribuídos ao espírito. Chico nunca deixou de citar a presença e a influência de Emmanuel sempre que possível. Em 1998, já no final da vida, Chico afirmou que seu guia iria reencarnar na Terra por volta do ano 2000, vivendo no Estado de São Paulo.
Ao mesmo tempo em que os primeiros volumes atribuídos a Emmanuel eram publicados, Chico também lançou livros inteiramente assinados pelo espírito de Humberto de Campos, entre eles Pátria do Evangelho, de 1938, Novas Mensagens, de 1940, e Boa Nova, de 1941. Esses trabalhos, no entanto, geraram problemas para o médium e para a Federação Espírita Brasileira.
A viúva do escritor, Catharina Vergolino de Campos, começou a solicitar à entidade os royalties sobre os títulos atribuídos ao marido falecido e colocou Chico novamente no centro de uma grande polêmica nacional. Os debates em torno das psicografias de Chico – principalmente em relação a poemas de autores famosos em Parnaso – ainda ganhavam espaço nos jornais da época, e o médium se viu no meio de duas frentes de batalha simultâneas na imprensa.
Em 1944, a viúva e os filhos do escritor entraram com um processo judicial. A família de Humberto de Campos queria que a Justiça decidisse se os livros psicografados por Chico Xavier eram mesmo de autoria de Humberto de Campos. Se a Justiça entendesse que os escritos eram fraudes, a viúva pedia o pagamento de indenização por perdas e danos, podendo Chico ser preso por falsidade ideológica.
Caso a obra póstuma fosse considerada legítima, Catharina queria receber os direitos autorais. A opinião pública aguardava com grande expectativa a decisão do juiz João Frederico Mourão Russell. Isso porque a ação colocou a autoridade frente a um dilema inédito e peculiar. Se aceitasse a tese de fraude, talvez o médium mineiro acabasse preso. Se avaliasse os textos como verdadeiros, a Justiça brasileira aceitaria formalmente a existência de vida após a morte, dando a jurisprudência ao pagamento de direitos autorais por livros ditados do além.
Críticos literários e outros interessados analisaram a fundo outra vez os livros em questão. Houve divergência entre quem via embuste e quem confiava na palavra de Chico. O médium, mesmo diante da possibilidade de ser preso, confirmou que tinha contato com o espírito de Humberto de Campos e com os demais autores que já havia psicografado.
No meio da polêmica, em 15 de julho de 1944, o próprio morto teria demonstrado o desconforto com a situação em carta psicografada por Chico Xavier:
Eis, porém, que comparecem meus filhos diante da Justiça, reclamando uma sentença declaratória. Querem saber, por intermédio do Direito humano, se eu sou eu mesmo, como se as leis terrestres, respeitabilíssimas embora, pudessem substituir os olhos do coração.
Abre-se o mecanismo processual e o escândalo jornalístico acende a fogueira da opinião pública. Exigem meus filhos a minha patente literária e, para isso, recorrem à petição judicial. Não precisavam, todavia, movimentar o exército dos parágrafos e atormentar o cérebro dos juízes. Que é semelhante reclamação para quem já lhes deu a vida da sua vida? Que é um nome, simples ajuntamento de sílabas, sem maior significação? Ninguém conhece, na Terra, os nomes dos elevados cooperadores de Deus, que sustentam as leis universais; entretanto são elas executadas sem esquecimento de um til.
Na paz do anonimato, realizam-se os mais belos e os mais nobres serviços humanos. Quero, porém, salientar, nesta resposta simples, que meus filhos não moveram semelhante ação por perversidade ou má-fé. Conheço-lhes as reservas infinitas de afeto e sei pesar o quilate do ouro da carinhosa admiração que consagram ao pai amigo, distanciado do mundo. Mas, que paisagem florida, em meio do mato inculto, estará isenta da serpe venenosa e cruel? É por isto que não observo esse problema triste, como o fariseu orgulhoso, e sim como o publicano humilhado, pedindo a bênção de Deus para a humana incompreensão.
No fim de 1944, o juiz declarou que a viúva só tinha direito a receber dinheiro pelos livros que o marido havia publicado em vida. Com a decisão, a Justiça encontrava uma saída em que não era preciso julgar se as psicografias eram ou não verídicas. Chico estava livre para seguir seu trabalho.
A produção do médium era solitária – no plano físico, ao menos. Raramente era visto em confraternizações e não há registro de que tenha tido um namoro. Passava os dias no trabalho ou escrevendo. Não se sentia sozinho, pois vivia cercado de vozes. E, em meio à polêmica sobre os livros de Humberto de Campos, ele ganhou uma nova companhia. Chico relatou que um novo espírito começou a rondar suas sessões de psicografia ao lado do velho guia Emmanuel: André Luiz.
Este conteúdo faz parte do livro Chico Xavier: A vida. A obras, publicado pela Superinteressante em 2016.
Fonte:http://super.abril.com.br/tudo-sobre/chico-xavier/
Como Chico Xavier se tornou tão popular - Super Livros #5

Publicado em 3 de abr de 2017

Se estivesse vivo, Chico Xavier teria completado 107 anos neste domingo. Para seus seguidores, ele viveu como profeta e morreu como santo. Para os detratores, ele era uma fraude a ser desmascarada.

Conversamos com Alexandre de Santi, um dos autores do livro “Chico Xavier – A vida. A obra. As polêmicas” sobre este que se tornou uma das principais figuras religiosas do Brasil.

Fonte:https://www.youtube.com/watch?v=_BKXsuvhIcA

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