AS CASTAS E OS "OUTROS" NA ÍNDIA - COMPREENDENDO COMO FUNCIONA O SISTEMA CASTAS NA CULTURA HINDU

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Brâmane colocando a tika – uma pasta de cor vermelha -, na cabeça de uma devota


As Castas e os “Outros” na Índia


Um copo voa através do salão e choca-se contra a parede, e todos os homens param de tomar seus respectivos chás. Em seguida, muito irritado, o senhor que arremessou o copo larga algumas rúpias no balcão – o suficiente para pagar o chá que tomou e o copo que quebrou -, e deixa o local. Por anos, ele batalhou contra a pobreza e o preconceito na escola e na universidade, mas finalmente conseguiu seu PhD em Direito, e tornou-se professor da Universidade de Delhi. Todavia, quando o dono do bar lhe entregou o chá, perguntou-lhe qual era a sua casta. “Eu sou um dalit”, disse o professor. “Então, lave o copo você mesmo, quando acabar de usá-lo”, disse o dono do bar. “Ele não tocava nenhuma coisa tocada por mim. Eu tornava impuro o objeto. Eu sou um intocável”, desabafou.
Em outro lugar, um menino foi atacado por um touro. Vendo a cena, as pessoas, preocupadas, correram para ajudá-lo, mas alguém gritou que o menino era um intocável, e elas desistiram de salvá-lo. Ele morreu.
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O sistema de castas não se restringe à Índia, e está presente em outros países do sul da Ásia, como o Nepal
Quando se fala na Índia, de imediato várias imagens passam por nossa cabeça. Pensamos em espiritualidade, em palácios esplendorosos, em mulheres de sari, em vacas passeando despreocupadamente por ruas empoeiradas e repletas de gente. Pensamos também em castas, frequentemente com indignação, diante da ideia de discriminação que com elas está relacionada.
Casta não é originalmente uma palavra hindu, mas sim portuguesa. Aquilo que, no Ocidente, chamamos de casta, os hindus denominam de varna (cor, em sânscrito).
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Em Varanasi, brâmanes conduzem o ritual do fogo na beira do Rio Ganges
As castas têm uma história muito longa na Índia. As primeiras referências a elas constam dos Vedas, os textos mais antigos e mais sagrados no hinduísmo, que já fazem referência às 04 castas: brâmanes (sacerdotes e intelectuais), xátrias (guerreiros e administradores, responsáveis por manter a ordem), vaixás (comerciantes, agricultores e pecuaristas) e sudras (camponeses e operários, que devem servir as outras castas em um sentido geral). As três primeiras castas são consideradas castas elevadas, e a última digna de menor status. No entanto, todos aqueles pertencentes às castas têm maior respeitabilidade do que aqueles indianos que não pertencem a casta alguma, os intocáveis, também chamados de dalits – termo utilizado por eles próprios, e significa “aqueles que são oprimidos”. Na prática, os dalits funcionam como uma quinta casta.
Por sua vez, os jatis são como subcastas, estreitamente relacionadas com o local do nascimento e a ocupação da família, que é passada de geração em geração. Cada jati está relacionado a uma casta (varna). Ninguém sabe ao certo quantas subcastas existem, mas alguns especulam que podem ultrapassar 10 mil, o que faz sentido, já que a Índia é o país dos superlativos, abençoada por seus 33 milhões de deuses (ou 33 mil ou 33 bilhões, vai saber).
E os estrangeiros, que lugar eles ocupam no sistema de castas? Os estrangeiros não têm lugar no sistema de castas. Isso não significa que eles sejam tratados como um dalits, mas pode implicar restrições, como a proibição de entrar em certos templos, por exemplo. Ademais, diante da forte tradição de hospitalidade, o estrangeiro, principalmente o turista, regra geral, é tratado como um deus na Índia, principalmente se houver a perspectiva de uma boa gorjeta.
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Os sudras também sofrem preconceitos, mas numa escala menor do que os dalits
De acordo com o mito trazido nos Vedas, no início, havia o gigante Purusha – que significa, em sânscrito, Homem Cósmico -, o qual foi sacrificado pelos deuses, que, a partir dos pedaços de seu corpo, construíram o universo, inclusive as quatro castas: da boca de Purusha, veio os brâmanes; dos braços, os xátrias; das coxas, os vaixás; dos pés, os sudras. Parece estranho, fantástico, mas a história bizarra de um, é a religião do outro. O que achariam os indianos daquela estória envolvendo maçãs, serpente e folhinhas do parreiral?
De qualquer forma, o sistema de castas tem como pressuposto que as pessoas são criadas diferentes, e possuem características diversas e inatas, decorrentes das suas encarnações passadas. Tal diferença teria estreita relação com a ideia de pureza. As castas mais altas seriam por natureza mais puras do que as mais baixas, e a mais pura de todos seriam os brâmanes.
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Os ferozes clãs rajputs do norte da Índia pertencem à casta xátria
A importância da casta não pode ser compreendida sem referência ao conceito de dharma, cuja tradução é muito difícil, mas significa algo como o padrão para a condução apropriada da vida de cada um. O dharma de uma pessoa é ditado pela sua casta. Assim, por exemplo, o dharma do guerreiro é lutar, e o do brâmane, realizar os rituais. Todavia, a casta não determina apenas o trabalho que a pessoa pode realizar, mas impõe também regras relativas ao casamento, à dieta e à higiene. O homem nunca pode casar fora de sua casta, embora a mulher, em algumas raras circunstâncias, possa. Isso tudo entre outras regras e restrições.
É um fenômeno não só religioso, mas também social, econômico e político, embora, nesse último aspecto, seja importante notar que cada casta tem as suas regras, cujo cumprimento é fiscalizado pela própria casta e não por eventuais castas superiores. Existe todo um gênero de literatura dedicado à descrição do dharma de cada casta, o dharma-sastras. Assim, a casta determina o dharma da pessoa, e o dharma delimita quais ações geram karma bom e ruim, e, dessa forma, a observância, ou não, das regras da casta têm resultados diretos na próxima encarnação do hindu. Coisa seríssima.
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Mesmo as mulheres das castas mais baixas vestem seus coloridos saris
Tradicionalmente, considera-se que a impureza dos dalits não pode ser removida por ritual algum. Assim, para evitar que contaminassem os membros das outras castas, os intocáveis eram submetidos a terríveis restrições. Por exemplo, eram obrigados a viver fora do vilarejo e a andar pela região somente de noite, para impedir que os membros das outras castas fossem contaminados pela simples visão dos dalits. Eram ainda proibidos de frequentar as mesmas instalações públicas, como escolas e hospitais, de beber dos mesmos poços de água, de comer na mesma mesa, de frequentar os mesmos templos que os demais hindus, e de tocar os mesmos objetos. Até mesmo a sombra dos dalits deveria ser evitada. Aos dalits eram reservados os trabalhos que o hinduísmo considerava mais poluidores, como o manuseio de cadáveres e de couro extraídos das sagradas vacas depois de mortas.
Uma casta ou subcasta é considerada como “alta” se o seu modo de vida é considerado como “puro”, e “baixa” se sua atividade é considerada “poluente”. Dentro da mesma casta, há gradações hierárquicas entre as subcastas. Mesmo entre as castas inferiores, busca-se frequentemente uma subcasta ainda mais inferior para se impôr. Veja-se ainda que a repulsa diante dos dalits transcende religião, sendo compartilhada por cristãos, mulçumanos e parsis, por exemplo.
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Lidar com os mortos e com a sujeira é tida uma atividades impura, reservada aos dalits
O sistema de castas manteve a sociedade indiana estável por mais de 2.000 anos, apesar da sua perene fragmentação política. Tal situação mudou, quando o pensamento ocidental começou a penetrar na sociedade indiana, durante a dominação do Raj Britânico, trazendo consigo ideias relacionadas à igualdade de todos os seres humanos. Hoje a influência do sistema de castas é sensivelmente mais forte nas zonas rurais do que nas cidades, onde a mobilidade social é mais fácil, inclusive para além dos limites designados pela casta. Todavia, mesmo entre os membros da classe média urbana, o preconceito de casta persiste, principalmente na hora de casar. Os classificados de casamento do jornal de domingo – sim, na Índia existem classificados de casamento, e lemos alguns bens engraçados – seguem com a divisão dos anúncios por casta e subcasta (jatti).
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Embora os brâmanes sejam considerados a casta mais alta, oito entre dez milionários indianos pertencem à casta dos vaixás
Em 1950, a Constituição indiana aboliu toda discriminação contra os dalits, bem como instituiu uma série de ações afirmativas para o seu empoderamento, inclusive cotas em diversas áreas, como, por exemplo, vagas reservadas no serviço público e nas instituições de ensino.
Uma figura central na luta pelos direitos dos intocáveis foi Bhimrao Ramji Ambedkar, primeiro Ministro da Justiça indiano, principal arquiteto da Constituição indiana, um dos responsáveis pela reintrodução do budismo na Índia, e um dalit, o primeiro a estudar no exterior. Durante os anos que antecederam a independência indiana, ele comandou marchas – similares às de Gandhi -, em que dalits se reuniam para beber dos reservatórios coletivos de água e para entrar em templos cuja entrada, na época, lhes era proibida. Nesse contexto, a conversão de Ambedkar para o budismo mostra-se bem apropriada, uma vez que o budismo foi um dos primeiros movimentos a desafiar o sistema de castas, pois as suas sanghas (comunidades) aceitavam, desde o princípio, membros de todas as origens, sem restrições. Doutrinariamente, não há sistema de castas no budismo.
Ambedkar aconselhou aos seus seguidores que se convertessem para qualquer outra religião, para se livrar, assim, do estigma da intocabilidade. Não foi uma ideia nova. Ao longo dos séculos, milhões de indianos converteram-se para outras religiões – como o islamismo, o sikhismo, judaísmo e o cristianismo, todas presentes na Índia – para deixar para trás os sofrimentos associados com o sistema de castas. Todavia, essas iniciativas subestimaram o alcance do preconceito de casta, que transcende o hinduísmo, e permeia toda a sociedade indiana. Para muitos, é possível mudar de religião, mas não escapar da casta, independentemente, inclusive, do sucesso econômico da pessoa. Mesmo na atualidade, em muitas comunidades cristãs na Índia, os dalits possuem um cemitério separado dos demais devotos – sim existem muitos cristãos na Índia, mas isso é tema para outro papo, basta dizer que, de acordo com a lenda, incrédulo São Tomé está enterrado no sul do país.
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Muitos dos seus seguidores consideram Ambedkar um bodisatva, um ser iluminado muito próximo de Buda, algo como um santo no cristianismo
Gandhi também era vigorosamente contra a intocabilidade – chegou inclusive a limpar latrinas, para demonstrar a sua solidariedade com os dalits -, muito embora, por vezes, defendesse os méritos do sistema de castas. Essa ambiguidade conduziu a muitos enfrentamentos entre ele e Ambedkar, partidário da aniquilação da divisão da sociedade indiana em castas. Até hoje, os dalits lembram de Gandhi – um vaixá – com mágoa, por conta da sua dubiedade nesse assunto. Mas vamos deixar a conversa sobre o Gandhi para depois.
IMG_1905Pertencer a uma das castas altas não significa necessariamente boa condição econômica
Na Índia atual, não se sabe ao certo quantas pessoas pertencem a cada casta ou à categoria de intocável. O último censo divulgado do qual constava tal informação foi realizada ainda sob o Raj Britânico, em 1931. Em 2011, mais uma vez, foi feito um censo em que foi questionada a casta dos inquiridos, mas esse aspecto da pesquisa não foi ainda divulgado. Dados de 2001 estimam que os dalits constituem 16,2% da população da Índia, que conta com mais de 1,2 bilhões de habitantes. Faça a conta, é bastante gente.
As ações afirmativas implementadas desde a Constituição indiana de 1950 melhoraram a vida dos dalits e de outros grupos desfavorecidos, como os sudras, mas não acabou com o preconceito e a violência advinda do sistema de castas. A nova classe média dalit é um dos símbolos da nova Índia, mas isso não pode ser confundido com o fim dos preconceitos contra os intocáveis, que encontram dificuldade, ainda hoje, para coisas simples, como conseguir um empréstimo bancário. Muitos dalits escondem a sua casta, para que ela não prejudique os seus negócios. Isso, no entanto, não é simples, pois, a partir do sobrenome e do local de nascimento da pessoa, é possível determinar a casta dela.
Além disso, a violência contra os dalits, por conta de sua casta, é relativamente comum, e é animada muitas vezes pelo ressentimento contra a sua ascensão social.  Não são raras as notícias da destruição de estátuas de Ambedkar por pessoas de casta elevada. Contudo, apesar dessa mobilidade social, um terço dos dalits ainda vivem abaixo da linha da pobreza.
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Jovem brâmane cuida da estátua de Vishnu
A Índia tem resistido às investidas de segmentos da comunidade internacional, que deseja tratar o sistema de castas como uma forma de racismo, não muito diferente, ou ainda pior, do que o apartheid sul-africano. O Governo Indiano afirma que tal questão é um assunto interno, e não um assunto para conferências internacionais, e tem conseguido impedir qualquer rotulação do assunto como racismo.
Embora seja sempre difícil discutir certo e errado em assunto de religião, é impossível discordar da injustiça das restrições, preconceitos e violências dos quais as pessoas de casta inferior são vítimas. Porém, antes de apontarmos o dedo para outras culturas, é necessário refletir sobre a nossa própria. Apesar de todos os milênios de problemas e rancores acumulados, em 2012, a Índia contava com uma taxa de 3,5 homicídios por 100.000 habitantes, enquanto o Brasil amargou o índice de 21,8 homicídios por 100.000 habitantes. E, enquanto viajávamos pela Índia, por mais pobre que o lugar fosse, nunca nos sentimos ameaçados. Pobreza e opressão não se traduz necessariamente em violência física. Na Índia, a religião não é apenas algo que você preenche num formulário, e algo que é vivido concretamente, e a ideia de reencarnação, karma e responsabilização para além da vida talvez tenha alguma coisa a ver com essa diferença de respeito pelo outro. Será que não há nada de interessante no hinduísmo que pudéssemos importar para o Brasil?
Viaje para a Índia, e descubra não só a beleza dos seus palácios, a riqueza da sua espiritualidade e a gentileza de seu povo, mas também a opressão e a amargura trazida pela discriminação em razão da casta.
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 Os lavadores são uma subcasta dos dalits

Fonte:https://www.borboleteandoporai.com/viaje-para-a-india-casta-o-sabio-o-guerreiro-o-empresario-o-trabalhador-e-os-outros/




ESPECIAL: A SOCIEDADE DE CASTAS NA ÍNDIA


Sistema de castas não tem valor legal, mas os dalits – que estão abaixo de todas as castas e são considerados “impuros” – continuam sentindo na pele a discriminação
Heloísa Scognamiglio
Em muitos locais da Índia, principalmente nos estados mais pobres, a prática da limpeza manual para a remoção de excremento humano ainda é comum, apesar de já existirem duas leis, de 1993 e de 2013, que proíbem esse tipo de trabalho. No dia 22 de março, a BBC publicou um ensaio fotográfico que mostra a rotina dos limpadores de latrina no país e que levantou novamente o debate sobre o sistema de castas – a atividade é realizada exclusivamente pelos dalits, também conhecidos como os “intocáveis”.
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As crianças dalits também sofrem com a discriminação, sendo excluídas pelas crianças de castas superiores, que não querem se tornar “impuras” (Créditos: Divyajant Solanki/Epa/Efe)
A divisão da sociedade indiana em castas é milenar. O sistema de estratificação social funciona de forma bastante rígida. Nele, nascer em uma casta, quase sempre, significa que o indivíduo morrerá fazendo parte dela. A mobilidade social quase não existe. Assim, os dalits limpam os banheiros das castas superiores porque é o seu “karma” e porque seus pais e avós faziam o mesmo. Enquanto isso, ativistas afirmam que é uma nova forma de escravidão, pelas condições do trabalho e pelo pagamento mínimo, além da discriminação sofrida por eles.
A origem do sistema não é muito precisa, mas antigos textos hindus indicam que a sociedade era dividida em varnas (cor da pele, em sânscrito). A palavra casta surge apenas no século XV. A divisão é de acordo com o papel social que os indivíduos possuem: os brâmanes são os mais nobres, ocupando cargos religiosos e exercendo atividades intelectuais; os xátrias são administradores em geral e guerreiros; os vaixás são comerciantes; e os xudras são trabalhadores braçais ou serviçais em geral.
Já os dalits são os sem castas, os párias. Eles são um grupo que é excluído do sistema, sofrendo muita discriminação. São considerados impurosm, sujos e, por isso, não devem ser tocados pelas outras castas. Indivíduos de castas superiores que são tocados por dalits devem se submeter a inúmeros rituais para obterem a purificação. Os dalits também são obrigados a exercer as funções que são consideradas mais desprezíveis, pois são os únicos trabalhos que lhes são confiados, como enterrar os mortos e a já mencionada limpeza dos excrementos.
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Dalits são considerados “poluídos” e recolher excrementos é um dos únicos trabalhos que conseguem; muitas vezes, eles nem recebem o pagamento, mas continuam fazendo o serviço por medo de ameaças (Créditos: Patrícia Campos Mello/Folhapress)
Ricardo Luigi, mestre em Geografia pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro, ressalta que as castas são muito diferentes do conceito de “classes sociais”: mesmo que uma casta seja socialmente discriminada, isso não significa que os seus integrantes sejam pobres, assim como pertencer a uma casta prestigiada não quer dizer que há capital financeiro. “Sempre houve ricos e pobres dentro de cada casta, sendo que, logicamente, as castas inferiores sempre possuíram menos possibilidades econômicas nessa estrutura”, afirma.
Ao longo do tempo, a Índia passou por muitas mudanças. A primeira Constituição do país depois da independência, de 1950, tirou o valor legal da sociedade de castas e proibiu todas as formas de discriminação contra os dalits, inaugurando as chamadas “políticas de reserva”. Tais políticas, também chamadas de cotas, já proporcionaram ao grupo acesso à educação e diversas oportunidades, através do ingresso em universidades e do emprego público. No entanto, a discriminação social ainda é muito forte, porque as castas se tornaram um elemento cultural enraizado no cotidiano da Índia, principalmente em áreas rurais e menos desenvolvidas.
O doutor em Ciências Sociais pela Universidade de Brasília, Cláudio José de Oliveira Souza, afirma que, apesar de tal divisão da sociedade não existir legalmente, ela ainda persiste, contribuindo muito para a desigualdade social. “Ela persiste culturalmente, apesar de juridicamente não existir”, explica. Ele ainda acrescenta que, antigamente, o sistema era mais forte. No entanto, com o processo de secularização da Índia, o seu poder de influência diminuiu – mas não desapareceu. “Por ser parte de uma religião da qual 80% da população indiana é praticante, o sistema informal de castas tende a persistir”, acrescenta.
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Dos dalits catadores de excrementos, 98% são mulheres (Créditos: Getty Images)
Essa persistência pode ser observada no preconceito e na exclusão social vividos pelos dalits. Eles são obrigados a trabalhar em condições deploráveis, como nos casos dos catadores de excremento, são humilhados por não poderem frequentar os mesmos lugares que as castas superiores, além de não poderem ser tocados, e são vítimas constantes da violência, principalmente as mulheres: abusos sexuais, estupros e assassinatos são os casos mais comuns.
Consequência direta do sistema de castas, a desigualdade social é o maior problema que a Índia enfrenta, na opinião da doutora em Ciência Política pela Unicamp, Sandra Aparecida Cardozo. “A Índia é um país que ainda é caracterizado pela desigualdade social, mas pela expressão do crescimento econômico indiano nos últimos anos e o alcance tecnológico em vários setores, particularmente na área de Tecnologia da Informação, o sistema de castas não trava este processo”, diz. “O desafio dos governos é enfrentar as múltiplas desigualdades que marcam o país e associar todo o crescimento com a diminuição da pobreza”, finaliza.
Por fim, é importante ressaltar que as castas não são uma exclusividade do hinduísmo – elas também existem em diversas outras religiões, além de serem muito comuns em sociedades asiáticas e africanas. Enquanto elas ainda persistem, diversas ONGs internacionais tentam fazer com que os outros países exijam um maior respeito aos Direitos Humanos por parte da Índia. A que possui maior destaque é a Human Rights Watch, que tem sede nos Estados Unidos, mas tem muita força na Europa.
Fonte:https://webjornalunesp.wordpress.com/2015/04/14/especial-a-sociedade-de-castas-na-india/

Como é o sistema de castas na Índia?


A religião oficial da Índia é o hinduísmo, no qual está contido o sistema de castas. Estabelecido por volta de 850 a.C., tem base na hierarquia de “classes” de seres humanos.
A origem desta supremacia de algumas “raças nobres”, como eram consideradas, provém do embate entre grupos indianos brancos e imigrantes de pele escura.
Além de hierárquico, esse sistema é hereditário e endógamo. Clarifiquemos alguns termos:
– Hereditário: Passado de pais para os filhos. Neste caso, o filho já nasce condicionado à classe social de seu pai.
– Endógamo:  Permissão de casamento apenas entre o próprio grupo. No caso da Índia, dentro da própria casta.
Esta crença se deve ao valor dado à reencarnação. Sendo assim, as atitudes de vidas passada seriam responsáveis por definir a posição do ser na vida atual.
Tais características são manobras para que se estabeleça a imobilidade social. Ou seja, o indivíduo já nasce condicionado a seu modo de vida. Além de sua casta, seu trabalho, sua vestimenta e hábitos também serão hereditários e imóveis no tempo.
Castas baixas
Apesar de vir sofrendo crescentes divisões, esse sistema ainda preserva algumas classes base.
São algumas das castas mais baixas e seus constituintes:
– Xátrias: guerreiros;
– Vaixias: comerciantes e camponeses;
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– Sudras: escravos,
– Dalits ou “Intocáveis”: sujeitos a margem até mesmo das castas mais baixas, considerados impuros. São associados à morte e à sujeira. Os intocáveis só podem utilizar roupas encontradas nos corpos de outro mortos.
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Castas altas
A casta mais alta é constituída por sacerdotes, religiosos e nobres, e denominada “Brâmane”.
Os bramânes são extremamente respeitados na Índia e apesar da imobilidade social ser conhecida dentro das castas, grupos insistem em práticas como vegetarianismo para se “aproximar” das práticas das castas mais puras.
Luta sem fim
Com o histórico de enraizamento deste sistema no país, torna-se praticamente impossível extingui-lo nos dias atuais. Alguns episódios já foram exemplo de repulsa a este sistema, como a luta de Mahatma Gandhi após a independência da Índia em 1947, ou a ação da ONU e órgão humanitários de todo o mundo.
Atualmente este sistema de resignação é proibido por constituição, entretanto, ainda é praticado por quase a totalidade do grande país.

  • Escrito por Julia Zayas da Equipe Eu Sem Fronteiras.
Fonte:https://www.eusemfronteiras.com.br/como-e-o-sistema-de-castas-na-india/

O sistema de Castas na Índia





Muitas pessoas me perguntam se na Índia realmente existe a divisão por castas. É um assunto muito delicado e confuso para se entender, pois o sistema de castas foi proibido legalmente pela constituição de 1947, que também instituiu leis específicas para o acesso à educação e a postos de trabalho melhor remunerados. Porém, 68 anos depois, o sistema, que teoricamente é crime, continua a existir sim.
Castas é a divisão social passada de pai para filho. Eles acreditam que Brahma, que para eles é o Deus que criou e comanda o universo, dividiu as pessoas em grupos. Os principais são:
Os brâmanes (sacerdotes e letrados): nasceram da cabeça de Brahma. Dentre as profissões exercidas por eles estão as de sacerdotes, professores e filósofos.


Os xátrias (guerreiros): nasceram dos braços de Brahma. Exercem profissões como as de soldados, policiais e administradores.
Os vaixás (comerciantes): nasceram das pernas de Brahma.


Os sudras (servos: camponeses, artesãos e operários): nasceram dos pés de Brahma.
E abaixo dos pés de Brahma, à poeira, estão os párias, que são conhecidos também como dalit, ou intocáveis.


Eles fazem as tarefas mais servis, dentre elas: coleta de lixo, remoção de excrementos humanos, varrer, pavimentar e eliminar corpos humanos e de animais. E quase sempre sem usar nenhum equipamento de proteção.
A Índia é o país com a segunda maior população do mundo, com 1,21 bilhões de pessoas. Os “intocáveis” são aproximadamente 16% da população indiana; isso equivale a mais de 170 milhões de pessoas, morrendo diariamente em extrema pobreza. Os indianos ricos ou de alta casta não passam de 8% da população. E o restante, 76% da população indiana, são de castas intermediárias.
Conversando com os indianos para tentar entender melhor sobre esse sistema, nem eles sabem ao certo quantas castas existem. Dentro dessas principais, há várias divisões e subdivisões e em cada uma suas próprias regras. E a cada dia surgem novas ramificações. Me informaram que há mais de 4 mil subcastas.
Eles são conformados com a casta a que pertencem, acreditam que se não nasceram em uma boa, em uma próxima encarnação Brahma irá recompensá-los diante do que fizerem de bom e correto nesta vida. Tudo se baseia no Karma. No hinduísmo, a palavra “carma” em sânscrito significa “ação”. Refere-se ao efeito que nossas ações geram em nosso futuro, tanto nesta como em outras encarnações.
Alguns “intocáveis” que tentam sair dessa condição são agredidos e muitos são mortos, poucos são os casos de sucesso.
O sistema é tão enraizado na cultura deles que está presente em todos os momentos. No dia a dia isso pode ser notado com muita facilidade. Para se arranjar um casamento, por exemplo, ambos devem pertencer a mesma casta. A família define tudo e muitas vezes a pessoa que irá casar nem conhece o pretendente, são os casamentos arranjados. No jornal onde se encontra o caderno de classificados para candidatos a casamento,  os anúncios também são divididos por castas. As amizades também são definidas pelo sistema e quando uma pessoa é apresentada a outra, eles sempre querem saber o sobrenome, pois assim já sabem a que casta pertence.
Os indianos são muito curiosos e não possuem nenhum receio de perguntar sobre assuntos pessoais ou até mesmo quanto você ganha. Em todos os momentos você pode perceber a submissão. As faxineiras que limpam a casa nunca te olham diretamente nos olhos, algumas são até mais simpáticas, já outras se mantém bem distantes. Muitos prédios possuem elevadores separados, apenas os diretores podem usar e há um fiscal para isso, além de placas avisando que ninguém pode usar aquele elevador.
Banheiros também separados para donos e empregados nas empresas. Se você está no elevador e tem um faxineiro esperando, ele não entra, mas espera o elevador voltar e estar vazio. Ou quando algum entregador está com você no elevador, eles olham sempre para o chão, nunca há uma troca de olhares, nada.
Alguns templos também possuem filas VIPs e dependendo do seu status social você passa na frente tranquilamente. Nas empresas sempre há alguém servindo chá, água, café e esse “funcionário” é o faz tudo para eles, está sempre servindo e é o último para tudo, até para comer. Até mesmo alguns processos seletivos em escolas são feitos por castas.
Existem programas que foram criados para ajudar a população necessitada, como o Subplano Tribal, para tribos desfavorecidas, e o Subplano para Castas Desfavorecidas. O problema desses programas é que o orçamento que deveria ser destinado a ajudar, muitas vezes sofre a prática rotineira de desvios e fraudes.
Aqui há muita mão de obra e por conta de tanta oferta, eles pagam muito pouco e exploram cada vez mais essas pessoas que teoricamente estão “abaixo” no sistema de castas. É algo muito triste lidar com tantas diferenças e tantos contrastes diariamente. Mas isso é algo que para eles é tão natural que não causa nenhuma vergonha, ao contrário, muitos pensam que estão dando serviço para essas pessoas mais humildes e que não há nada de errado nesse sistema.
Muitas vezes me sinto incomodada, pois todos somos iguais, mais aqui isso não é verdade, é uma sociedade muito hipócrita, que muitas vezes utiliza a religião para colocar a culpa e tirar a responsabilidade social e moral que cada um possui. Sei que é algo que será muito difícil mudar, algumas coisas estão melhores, mas ainda há muito o que ser feito. Não adianta ter leis se as pessoas não mudam a mentalidade. Aqui você aprende a conviver com o extremo de tudo aquilo que você tinha como certo, como verdadeiro, e você percebe que existe um mundo muito maior do que o que você conhecia. Tento compreender e não julgar. Sim, é difícil, mas espero que um dia todos realmente tenham direitos iguais.
Fonte:https://www.brasileiraspelomundo.com/o-sistema-de-castas-na-india-141924079
Como funciona o sistema de castas na Índia

Como funciona o sistema de castas na Índia

Poucos temas geram tanta curiosidade em um estrangeiro na Índia quanto o sistema de castas. Saciar essa curiosidade, no entanto, não é tarefa fácil: considerado tabu pela maior parte dos indianos, não é um assunto que você vai puxar na mesa de jantar com aquela família que você conheceu sem causar constrangimento. Perguntar a casta de alguém é indelicado, para não dizer outra coisa. Acreditem, eu já vi isso acontecer e morri de vergonha alheia.
O sistema de castas vigora no país há muitos e muitos séculos e sua origem é incerta. Apesar de ter origem na fé hindu, foi incentivado e até mesmo reforçado pelos britânicos durante a colonização, transformando-o em algo muito mais rígido.

Hoje, existem cerca de 3 mil castas na Índia, o que é um confusão e tanta pra gente entender. Mas essas castas todas podem ser divididas em quatro grupos, que eram as castas originais:
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Brahmin (Brâmanes): A casta mais alta, é formada por pensadores e letrados, pessoas consideradas próximas aos deuses. Entre as profissões exercidas por eles estão as de sacerdotes, professores e filósofos. Na mitologia hindu, foram criados a partir da cabeça de Brahma.
Kshatriya (Xátrias): São os guerreiros, nasceram dos braços de Brahma. Exercem profissões como as de soldados, policiais e administradores.
Vaishya (Vaixás): São os comerciantes, nasceram nas pernas de Brahma.
Shudra (Sudras): São camponeses, artesãos e operários. Nasceram dos pés de Brahma.
Templos de Udaipur, Índia
Declarado ilegal em 1950, na época da independência, o sistema chegou bem vivo ao século 21 em forma de tradições, desigualdade social e preconceito. Isso foi possível porque, ao contrário da escravidão, o sistema de castas trabalha de uma forma muito mais sutil e informal.
Sim, hoje em dia não é mais possível criar, por exemplo, clubes exclusivos para membros de uma certa casta, mas as profundas desigualdades sociais e preconceitos originados por séculos de divisão garantem que a exclusão continue a acontecer.
Para nós, o sistema parece indecifrável e confuso, mas ele está bem arraigado na cultura dos indianos. Eles conseguem saber a qual casta uma pessoa pertence apenas pelo sobrenome. Foi por isso que os Sikhs, religião monoteísta muito popular no norte da Índia e que rejeita a divisão de castas, adotou para todos os seus membros um mesmo sobrenome: Singh para homens e Kaur para mulheres.
Golden Temple dos Sikhs Amritsar
Na Índia urbana, o sistema vem perdendo força com os anos, ainda que muito lentamente. Casamentos entres as três castas superiores, embora ainda não extremamente comuns, já não chegam a ser malvistos. No entanto, ainda continua valendo como lei em vilarejos e na Índia rural, onde vivem 857 milhões de indianos.
A consequência mais óbvia desse sistema é a perpetuação da desigualdade social. Mas, pelas coisas que eu vivi lá, eu diria que há mais. Nunca em um ambiente de trabalho eu senti a arrogância dos chefes quanto na Índia. Humilhações públicas eram ocorrências rotineiras no escritório. Era como se aquela posição tivesse sido designada a eles pelo próprio Brahma e não fosse fruto de um punhado de privilégios que eles tiveram desde o nascimento.
Jaipur, Índia
Claro que isso não é um regra absoluta. Há muita gente bem nascida (aos olhos do sistema) que vê a ignorância presente nessa divisão e luta contra as castas na Índia. Mas a minha experiência me mostrou que grande parte os membros das castas superiores ainda acredita que eles são merecedores natos do bom e do melhor e que são mais dignos de respeito que todos.
São pessoas difíceis de lidar, que não aceitam ser contrariadas e que acham que todos devem baixar a cabeça para o que dizem. Uma vez, em uma festa na minha casa, um playboyzinho chegou a chamar o Rafa para a briga porque ele queria impor a música que iria tocar e o volume do som. Quando nos recusamos a ceder, ele simplesmente tirou o som da tomada. Repetindo: era a minha casa, não a dele.
Por outro lado, membros de classes inferiores se resignavam a ouvir abusos que no Brasil dariam um ótimo caso de assédio moral. Se você ouviu a vida inteira que é um lixo inferior, uma hora você passa a aceitar. Além disso, se rebelar contra a “vontade de deus” tem consequências graves na fé hindu. Viva sua vida de dalit ou sudra humildemente e, quem sabe, na próxima encarnação você volta por cima da carne seca.
Fábrica de especiarias indianas

Dalits, os intocáveis

Se os sudras surgiram dos pés de Brahma, os dalits tiveram uma origem ainda menos nobre: foram criados a partir da poeira em que o deus pisou. Tratados como párias, excluídos da sociedade, os dalits não têm casta e são considerados impuros. Para eles são guardados os trabalhos que os outros indianos se recusam a fazer por considerarem indignos: recolher lixo e limpar banheiros, por exemplo.
Considerados portadores de impurezas por onde quer que passem, eles vivem um sistema opressivo digno de um apartheid. Um dalit não pode se sentar à mesa com membros de outras castas ou usar os mesmos pratos e copos. Em casas mais conservadoras, eles possuem uma entrada especial que só permite que eles cheguem até o banheiro e a área de coleta de lixo, sendo proibidos de colocar os pés na casa principal.
Trichy, Índia
Como o sistema hoje é cultural e não oficial, alguns poucos dalits conseguiram escapar de seu destino e ascender socialmente. No entanto, como cidadãos de um país que também sofre com extrema desigualdade, nós sabemos que quebrar o ciclo da miséria não é fácil. Para reparar os males causados por séculos de um sistema cruel, o governo indiano oferece cotas nas universidades e outros programas sociais, como a concessão de microcrédito, que visam a inserção dos párias na sociedade.
Um grupo minúsculo deles, aproveitando a abertura econômica do país nos últimos vinte anos, até mesmo enveredou pelo empreendedorismo e alcançou seus milhões de dólares, criando um fenômeno conhecido como Dalits Millionaires (link em inglês). Mas ainda existe um longo caminho a percorrer. Apenas 30% dos dalits é alfabetizado (a média do país é de 75%) e a discriminação contra crianças dalits nas escolas acaba fazendo com que elas abandonem as aulas. Eles também são as maiores vítimas de violência e crimes de ódio.
Mulher em Udaipur, Índia
Hoje, os dalits que conseguem escapar da sina de exercer as profissões indignas são aceitos na convivência de outros indianos. Contudo, mais que qualquer outra união entre castas, casar-se com um dalit é um ainda tabu tremendo.
Fonte:https://www.360meridianos.com/2014/10/como-funciona-o-sistema-de-castas-na-india.html
AS CASTAS NA ÍNDIA-ASPECTOS HISTÓRICOS
O sistema de castas da Índia é uma divisão social importante na sociedade Hindu, não apenas na Índia, mas no Nepal e outros países e populações de religião Hindu. Embora geralmente identificado com o hinduísmo, o sistema de castas também foi observado entre seguidores de outras religiões no subcontinente indiano, incluindo alguns grupos de muçulmanos e cristãos. A Constituição Indiana rejeita a discriminação com base na casta, em consonância com os princípios democráticos e seculares que fundaram a nação. Barreiras de casta deixaram de existir nas grandes cidades, mas persistem principalmente na zona rural do país.

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